segunda-feira, 23 de novembro de 2015

AVALIAÇÃO DE RISCO DE OGMS EXPRESSANDO RNA DE INTERFERÊNCIA: O FEIJÃO TRANSGÊNICO DA EMBRAPA

Caros leitores

Com a chegada do feijão transgênico na mesa dos brasileiros, prevista para 2016, está na hora de ler com atenção o artigo recente intitulado Biosafety research for non-target
organism risk assessment of RNAi-based GE plants. O artigo tem uma visão muito clara sobre a metodologia da avaliação de risco e as considerações que nos traz sobre iRNA são muito importantes. Aqui está o link:
(use o link download article à direita da tela do site)

A compreensão das questões e respostas mostradas neste artigo seguramente eliminará qualquer receio que alguém possa ter sobre o feijão da EMBRAPA resistente ao vírus do mosaico dourado do feijoeiro, que usa o mecanismo de interferência de RNA para impedir a multiplicação do vírus nas células do feijão. A EMBRAPA e a CTNBio seguiram essencialmente os passos delineados neste artigo. Em postagens anteriores analisamos a liberação deste feijão e avaliamos parte de seus riscos. Os links estão abaixo.

1) Rota ao dano pelo RNA de interferência no feijão transgênico da Embrapa

2) A fonte de informação correta para conhecer o feijão GM da EMBRAPA

3) Segurança do feijão GM da Embrapa: sobre a improvável existência de siRNA off target

4) Avaliação de risco do feijoeiro transgênico: serenidade na condução e consistência dos resultados na CTNBio


E também:
a) o texto do Graziano: A história do feijão GM como ela é

b)  “O feijão transgênico da Embrapa é seguro”, artigo de Francisco G. Nóbrega e Maria Lucia Zaidan Dagli

c) CTNBio refuta CONSEA quanto à segurança do feijão transgênico da EMBRAPA



terça-feira, 17 de novembro de 2015

Glifosato e transgênicos: tudo como dantes no quartel de Abrantes


EFSA conclui que o glifosato não é carcinogênico nem tóxico aos seres humanos, contrariando as conclusões da IARC. O que vale mais, a conclusão de uma agência de avaliação de riscos (a EFSA) ou a de uma agência de pesquisas (a IARC)? Leiam abaixo as considerações

Um comunicado da IARC (International Agency for Research on Cancer) de  2015 (Monografia 112, ver IARC 2015 e também Guyton et al., 2015) havia reclassificado o glifosato como  ‘probably carcinogenic to humans’ (group 2A)” “provavelmente carcinogênico para seres humans (grupo 2A)”, levantando uma onda de acusações contra os agricultores que empregam o produto, contra os produtores de variedades de plantas transgênicas que apresentam tolerância ao glifosato e contra todas as agências de risco do Mundo que haviam avaliado “erroneamente” o potencial carcinogênico do herbicida. Alarmistas de plantão imediatamente encontraram (ou ressuscitaram) evidências de que o glifosato causava câncer, autismo, colapso da colmeia de abelhas e muitas outras coisas.

Em novembro a EFSA (European Food and Safety Authority) publicou suas conclusões sobre o potencial carcinogênico do glifosato, à luz das evidências existentes. As conclusões da EFSA, que contrariam as da IARC, e recolocam o glifosato como herbicida de baixo risco para a saúde humana (em particular em relação ao potencial carcinogênico), estão abaixo.

 "EFSA concluded that glyphosate is unlikely to pose a carcinogenic hazard to humans and the evidence does not support classification with regard to its carcinogenic potential according to Regulation (EC) No 1272/2008."

“A EFSA concluiu que é improvável que o glifosato represente um perigo como carcinógeno para seres humanos e que a evidência não apoia a classificação com base em seu potencial carcinogênico de acordo com a Regulação (EC) no. 1272/2008”

O processo de revisão da avaliação de risco (RAR) pela EFSA iniciou em janeiro de 2014 e foi concluído agora (novembro de 2015).  As conclusões foram baseadas na avaliação dos usos representativos do glifosato como herbicida para o controle de ervas daninhas num grande número de culturas. Os detalhes dos usos representativos podem ser encontrados no Apêndice A do estudo da EFSA, linkado acima.

Em relação à carcinogênese, a avaliação da EFSA foi focada no produto ativo (o herbicida glifosato) e pesou todas as evidências disponíveis. A conclusão final é que o glifosato não está classificado nem proposto a sê-lo como carcinogênico ou tóxico.

A EFSA identificou alguns aspectos que demandam mais dados para que se possa concluir sobre segurança: a presença de resíduos (contaminantes) nas preparações comerciais e o destino ambiental do AMPA em solos ácidos(o AMPA é o produto gerado pelas plantas transgênicas quando degradam o glifosato). As questões remanescentes nada têm a ver com o potencial carcinogênico do glifosato.

Concluo alertando os leitores que a EFSA é uma agência de avaliação de risco, mas não a IARC. A avaliação de risco é um processo bem estruturado e, embora baseado em ciência, é pouco conhecido e levado a cabo por cientistas fora das agências de risco, exceto quando são partícipes de desenvolvimento de projetos onde a avaliação de risco é requerida pelos regulatórios de seus países. Não é de estranhar, portanto, que a IARC, uma agência de pesquisa em câncer,  tenha concluído erradamente sobre os riscos do glifosato. Volta-se, portanto, ao que sempre se soube: o glifosato é um herbicida com risco muito baixo para a saúde humana. Resta ver se os arautos do apocalipse agrícola e da intoxicação em massa vão rever suas posições, inclusive nosso Instituto Nacional do Câncer (INCA). Vou esperar sentado...

Referências

Guyton KZ, Loomis D, Grosse Y, El GhissassiF, Benbrahim-Tallaa L, Guha N, Scoccianti C, Mattock H, Straif K, 2015.  Carcinogenicity of tetrachlorvinphos, parathion, malathion, diazinon, and glyphosate. The Lancet (Oncology) 16(5): 490–491.

IARC (International Agency for Research on Cancer), 2015. Monographs, Volume 112: Some organophosphate insecticides and herbicides: tetrachlorvinphos, parathion, malathion, diazinon and glyphosate. IARC Working Group. Lyon; 3–10 March 2015. IARC Monogr Eval Carcinog Risk
Chem Hum.


segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Ainda sobre a rotulagem dos transgênicos

A lei brasileira obriga a rotulagem dos transgênicos para alimentação. Assim, a menos que seja mudada, ela deve ser cumprida. Se isso de fato protege o consumidor de algum dano a sua saúde ou se o consumidor se interessa pela questão, são as sementes para a discussão da lei e para a elaboração de uma nova.

A questão central da rotulagem é a proteção ao consumidor. A rotulagem obrigatória não está voltada a princípios religiosos, filosóficos ou outros quaisquer. Assim, se temos a rotulagem de produtos kosher ou halal, por exemplo (http://www.abiec.com.br/3_hek.asp),  ela atende aos que demandam um alimento preparado de acordo com estes princípios religiosos, mas não é obrigatória e é regulamentada, executada e em parte fiscalizada pelas entidades religiosas respectivas (veja, por exemplo, http://judaismohumanista.ning.com/forum/topics/lan-ada-nova-rotulagem-oficial-para-alimentos-kasher).  A pergunta então é: a par das questões filosóficas ou de temores fundados na percepção de riscos, acaso os alimentos transgênicos que estão no mercado, de acordo com nossa legislação, representam algum risco à saúde humana ou animal? A resposta, claramente, é: não.

Todos os organismos geneticamente modificados que estão no mercado brasileiro foram avaliados e aprovados pelo órgão competente, isto é, a CTNBio. Qualquer um pode discordar desta decisão, por várias razões, mas ela coincide com a decisão de todos os demais órgãos similares no Mundo: a EFSA europeia, o OGTR australiano, a FDA e o EPA norte-americanos, a agência canadense e por aí vai. Sem uma única exceção. Isso dá à decisão brasileira um enorme respaldo. As decisões de moratória têm sido sempre políticas, à revelia da opinião técnica do órgão regulador. E as opiniões contrárias provêm em geral de ativistas contra a biotecnologia ou de cientistas a eles alinhados (o Séralini e seu grupo e mais dois ou três grupos similares).

Sabendo disso, podemos considerar os alimentos seguros. Porque, então, rotular?
As dúvidas sobre a segurança que são em geral apontadas na mídia foram rotineiramente analisadas pelos órgãos técnicos: potencial alergênico das proteínas (estudo baseado em análise bioinformática) e estudos de toxicidade (estudos baseados em digestibilidade enzimática e ensaios de toxicidade aguda). Também as questões ambientais foram exaustivamente avaliadas (fluxo gênico e fixação em espécies novas e variedades, toxicidade para insetos não alvo e muitas outras) e os riscos, igualmente, foram considerados negligenciáveis (que é um nome técnico para dizer “quase nulos”). Somando as avaliações de saúde e ambientais, a conclusão para todos os OGMs até agora analisados é a mesma, aqui e em outros países: o risco é muito pequeno, efetivamente nulo, quando comparado à mesma planta não geneticamente transformada.

Por outro lado, uma parcela muito variável, porém em geral pequena, entende o que significa o rótulo atual e literalmente ninguém saberia dizer o que significam coisas como Agrobacterium tumefasciens, Bacillus viridochromogenes e nomes complicados que, entretanto, deveriam estar no rótulo por lei. Obviamente, além de ser desnecessário, um rótulo deste tipo implica em aumento no custo: o produto tem que ser analisado por técnicas bioquímicas ou genéticas caras e num mercado com mais de 40 transgênicos sendo vendidos, qualquer rotulagem que obrigue a identificação de níveis e genes/proteínas vai implicar em custos que serão repassados ao consumidor, encarecendo a cesta básica. Na ausência de danos comprovados à saúde e de riscos concretos identificados pelas agências de risco em todo Mundo, e na inexistência de casos concretos de danos à saúde em animais e seres humanos após quase 20 anos de consumo em imensas quantidades em quase todos os países do Mundo, a gente se pergunta: é justo encarecer a cesta básica com informações que não estão relacionadas a riscos concretos à saúde?


Em resumo: embora a percepção de risco indique que os transgênicos podem ser perigosos como alimentos, a avaliação de risco indica o contrário. Um país não deve tomar decisões em cima de percepções de risco, que são muito variáveis de pessoa para pessoa e mudam também em diferentes circunstâncias. A decisão tem que ser técnica, respeitando os princípios científicos da avaliação de risco. Assim foi com as vacinas, a fluoretação da água, a adição se sal no iodo e muitas outras coisas que são, até hoje, combatidas por grupos mais ou menos amplos da sociedade em função de sua percepção de risco. A obrigação legal de tal ou qual ação baseada nestas percepções de risco traz sempre problemas financeiros, dentre outros, sem contribuir um cêntimo para a saúde pública e a nutrição dos brasileiros.

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Ainda os agrotóxicos e os transgênicos: mais evidências de uma correlação inexistente

As oito pragas consideradas de maior risco fitossanitário e com potencial de provocar prejuízos econômicos foram definidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) (link: http://www.fundacaomeridional.com.br/noticias/2015/08/27/as-8-pragas-de-maior-risco-fitossanitario) .

São elas: a ferrugem da soja, o mofo branco, a Helicoverpa armigera; a mosca branca; os nematoides; a broca do café; as ervas daninhas resistentes e o bicudo do algodoeiro. Como se pode ver (consulte tabela abaixo), apenas uma delas tem uma relação vaga com os transgênicos: as ervas daninhas resistentes. Na verdade, a ligação direta é com herbicidas e com o manejo integrado de pragas e tecnologias equivocado. Isso é que faz surgir pragas resistentes, seja em plantações transgênicas ou em convencionais, de qualquer espécie. Quatro das oito pragas listatdas são controladas por inseticidas e algumas afetam muitas culturas diferentes. Finalmente duas são devido a fungos e uma a nematódios (estes últimos afetando muitas culturas).

Olhando isso a gente se pergunta: porque será mesmo que o Brasil usa tanto pesticida? Com o clima quente e uma agricultura gigante, a resposta é mais do que óbvia: todas as culturas sofrem com o ataque de insetos, fungos e nematoides e com a competição com ervas daninhas. E o controle é quase sempre químico, o que quer dizer que são empregados agrotóxicos (pesticidas, defensivos agrícolas ou ainda praguicidas, vários nomes prá mesma coisa). Isso sem contar com o ataque de roedores, pássaros, lesmas, carrapatos, mosca de chifre e outras pragas da agricultura e da pecuária, tudo também controlado com agrotóxicos. E o rocio químico de beiras de estrada e áreas industriais... e por aí vai.

Ah, mas a soja transgênica “toma banhos de glifosato”! e representa uma imensa área plantada. Será mesmo? Está tudo explicadinho em http://genpeace.blogspot.com.br/2015/08/desmascarando-ligacao-entre-aumento-do.html e não é nada disso, evidentemente.

 Culpar os transgênicos pelo aumento do uso de agrotóxicos é um erro primário ou uma afirmação maliciosa proposital.

Tabela das oito pragas agrícolas mais importantes listadas pelo MAPA em agosto de 2015
Praga
Agente
Controle químico
Ferrugem da soja
Fungo espalhado pelo vento
Fungicidas
Mofo branco da soja
Fungo espalhado pelo vento
Fungicidas
Lagarta (soja, algodão e milho)
Helicoverpa armigera
Inseticidas
Mosca branca (feijoeiro, fruteiras, etc.)
Bemisia sp.
Inseticidas
Nematoides (muitas culturas)
Várias espécies
Nematicidas
Broca do café
Hypothenemus hampei
Inseticidas
Ervas daninhas (todas as culturas)
Várias espécies
Herbicidas
Bicudo do algodoeiro
Anthonomus grandis
Inseticidas


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Desmascarando a ligação entre aumento do uso de agrotóxicos e transgênicos: um Comunicado da EMPRAPA lança luz à questão.

A Embrapa Agropecuária Oeste divulga o Comunicado Técnico sobre Viabilidade Econômica da Cultura da Soja na Safra 2015/2016, em Mato Grosso do Sul, de autoria de Alceu Richetti. Os estudos econômicos foram realizados em relação a três variedades distintas de soja. O documento revela um aumento médio de 14%  no custo de produção neste ano e indica que a soja RR dá vantagens ao produtor, em geral nos ganhos finais. O relatório descreve uma situação específica (do Matogrosso do Sul), mas a adoção da soja transgênica no Brasil está beirando os 99% e isso não é à toa.

O que isso tem a ver com a manchete da notícia? Muito. O Comunicado tem os cálculos detalhados de cada insumo usado por hectare na soja no Mato Grosso, tanto para a variedade convencional quanto para a transgênica. O leitor curioso pode ler uma sinopse das tabelas 2 e 3 naquilo que interessa a nós agora, os agrotóxicos.

Tabela 1: Sinopse das Tabelas 2 e 3 do Comunicado da EMPBRAPA


Soja convencional
Soja
RR
Produto
Unid.
Quantidade
Herbicida dissecante 1
L
3,00
3,00
Herbicida dissecante 2
Kg
0,06
0,06
Herbicida dissecante 3
L
1,50
1,50
Herbicida pós-emergente 1
L
1,20
3,00
Herbicida pós-emergente 2
L
0,40
0,06
Inseticida 1
Kg
0,12
0,12
Inseticida 2
L
0,06
0,06
Inseticida 3
L
0,25
0,25
Inseticida 4
L
0,40
0,40
Fungicida 1
L
1,00
1,00
Fungicida 2
L
1,50
1,50

Que curioso! A soja convencional e a soja transgênica RR, tolerante a herbicida, empregam ambas vários herbicidas antes do plantio e depois da emergência. As diferenças, se tomarmos um quilo por um litro, são de apenas 15%. Não existe nada parecido com “banhos de agrotóxicos”, como gosta de repetir o Dr. Melgarejo, nem aumento de 200% de uso de pesticidas, como afirma o Alan Tygel e outros colegas na mesma linha. As diferenças em milho e algodão são ainda menores, sugerimos que procurem e leiam os estudos sobre a questão.


Então, voltamos ao ponto inicial desta discussão: o que fez o Brasil aumentar em tanto o consumo de agrotóxicos? A intensificação da agricultura (inclusive da pecuária), num modelo que uso muito defensivo agrícola, independente da planta ser transgênica ou não.

Uma cadeira tem 4 pernas, um cavalo tem 4 pernas, logo uma cadeira é um cavalo. Este é o raciocínio por trás da inferência de que os transgênicos são responsáveis pelo aumento dos agrotóxicos no Brasil.

A ligação entre transgênicos e agrotóxicos é apenas uma fantasia, com a intenção de trazer aos transgênicos um risco que não lhes pertence, uma vez que riscos reais e diretos dos transgênicos ninguém mesmo está vendo e os defensores desta ideia já estão em descrédito.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Agroecologia e transgênicos: seis textos para análise

Numa série publicada em 2013 na  revista COLÓQUIO - Revista do Desenvolvimento Regional - Faccat - v. 10, n. 2, jul./dez. 2013, editada no Rio Grande do Sul, o Dr. Walter Colli, ex-presidente da CTNBio, escreveu um ensaio sobre Vavilov (https://en.wikipedia.org/wiki/Nikolai_Vavilov, o geneticista soviético perseguido por Lysenko até a morte, tentando fazer um paralelo com os argumentos dos Agroecologistas, que lembram - sem tirar nem por - os piores argumentos do stalinismo. Sua linha de argumentação é semelhante à minha numa postagem anterior no Genpeace: Uma “outra” ciência é possível, propõe Dario Aranda. Mas não é o primeiro a propor: Lisenko o fez antes na extinta URSS  (link: http://genpeace.blogspot.com.br/2015/08/uma-outra-ciencia-e-possivel-propoe.html). Uma leitura atenta do texto de Colli e dos demais publicados sobre agroecologia no mesmo número da revista revela um lado pouco conhecido da agroecologia, que tem, como tudo no mundo, o seu lado dark.

Seguem os títulos dos artigos, seus autores e links.

Boa leitura.

Walter Colli. Agroecologia e Ciência: um paralelo histórico – link: https://seer.faccat.br/index.php/coloquio/article/download/85/pdf_25  

Zander Navarro: Agroecologia: as coisas em seu lugar. (A agronomia brasileira visita a terra dos duendes) – link:  https://seer.faccat.br/index.php/coloquio/article/viewFile/23/pdf_11  

Amilcar Baiardi. Comentário sobre o artigo Agroecologia: as coisas em seu lugar (A Agronomia brasileira visita a Terra dos Duendes) – link:  https://seer.faccat.br/index.php/coloquio/article/download/87/pdf_27  

Zander Navarro. Agroecologia: a produção da mentira – link:

Felipe Feliz Mesquita. Agricultura orgânica: relato de uma experiência – link: https://seer.faccat.br/index.php/coloquio/article/download/86/pdf_26

Paulo Freire Mello: Agroecologia: as classes em seu lugar? – link: https://seer.faccat.br/index.php/coloquio/article/download/84/pdf_24


terça-feira, 11 de agosto de 2015

Uma “outra” ciência é possível, propõe Dario Aranda. Mas não é o primeiro a propor: Lisenko o fez antes na extinta URSS

O manifesto Declaración Latinoamericana por una Ciencia Digna – Por la prohibición de los transgénicos en Latinoamérica fala de uma “outra” ciência, supondo que a atual está comprometida com as corporações, em particular a ciência que tem interface com a biotecnologia. Há aqui um grave erro conceitual: a ciência é uma só e caracterizada pelo uso do método científico para a elucidação de questões. Não importa se o cientista está se debruçando sobre a busca de uma fórmula para uma série matemática ou se está em busca da compreensão de um novo mecanismo de manipulação do DNA. Seus resultados e sua análise, se obtidos com o emprego do método científico (consubstanciado nas várias metodologias de seu trabalho), serão válidos. Qualquer experimento que fuja destas regras básicas não tem validade.

Além disso, a ciência é um processo de construção e desconstrução gradual, com idas e vindas e uma história complexa de acertos e erros. Neste caminho a verdade nunca é absoluta, mas não deixa de existir. Esta afirmação parece absurda ao leigo, mas assim é: o que é aceito pela maioria dos cientistas é a “verdade”. Se houver outro ponto de vista igualmente baseado em ciência (isto é, com resultados obtidos e analisados de acordo com o método científico), ele será considerado como uma alternativa em estudo e só vencerá o main trend se for apoiado por uma parcela grande de cientistas. Se um grupo tem resultados que foram obtidos em violação aos princípios da experimentação científica, não pode pretender impor seu ponto de vista nem desafiar o que a maioria acredita, porque falta consistência (e, em última instância, verdade) nos resultados.

Claro está que existem regras rígidas quanto à ética experimental quando ela envolve animais e seres humanos nos experimentos. E o cientista, enquanto Homem, deve também pautar-se pela ética em seu comportamento em relação à sociedade. Estas regras não alteram resultados, mas validam o trabalho do cientista como ser social. Em todas as instituições de pesquisa, sejam públicas ou privadas, há comitês de ética e os próprios cientistas estão agudamente conscientes de seu papel como exemplos de comportamento ético, além de serem exemplos do indispensável modus operandi científico.

É certo que nem todo cientista é ético, mas a maioria o é. Imaginar que a maior parte dos que trabalham em investigação na interface com a biotecnologia é composta de cientistas antiéticos e que apenas um pequeno grupo de “independentes” é ético compõe a fantasia dos ativistas anti-OGM. O que fazem os ativistas é um julgamento ideológico dos cientistas que geram as descobertas e daqueles que fazem a inovação nesta área aplicada. Quem os julga tem em geral seus trabalhos na mesma área rejeitados pela maioria dos cientistas, não por qualquer característica ética ou anti-ética de quem gerou os resultados, mas pelo descumprimento do método cientifico na geração de seus resultados. É o caso do Séralini, do falecido Carrasco e de alguns outros: seus resultados foram obtidos com violações mais ou menos graves do método científico.


Poder-se-ia argumentar: acaso existe só um método científico? Uma “outra” ciência, em que a ética e a ideologia fossem os guias principais, e não a ditadura do método científico cartesiano, não poderia desenvolver sua própria metodologia? Sim, poderia! Tivemos um exemplo completo disso no biólogo Lisenko, que inventou uma nova genética e um novo método experimental que convinha à ideologia e à ética do Partido Comunista Soviético na ocasião. Os que se alinharam ao seu novo método, ungidos pelos santos óleos da ética stalinista, enterraram a agricultura soviética, que até hoje patina no underground. E os que tentaram continuar sendo cientistas à antiga, bem cartesianos, foram mandados para a Sibéria, como o grande geneticista Vavilov.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

“Movimento anti-transgênico é fruto de uma total irracionalidade” – será mesmo?

A afirmação acima, feita talvez num momento pouco feliz pelo Dr. António Coutinho, ex-diretor do Instituto Gulbenkian de Ciência e presidente da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa, vem sendo divulgada pela internet sem comentários de quem divulga (veja, por exemplo, a postagem no Agrolink). O Dr. Coutinho, por sua formação e atuação em ciência, compreensivelmente qualifica todo o movimento anti-transgênico como “irracional”. Mas não é assim: há uma legião de simpatizantes do movimento que se alinha a ele pela percepção de risco, que é moldada por um conjunto complexo de influências e informações. Não há irracionalidade nisso, mas um tempo limitado de cada um para se aprofundar num tema e a confiança que temos nos nossos pares.

Por exemplo, quem acredita num mundo agroecológico, sem as novidades técnicas do agronegócio nem a concentração de propriedade de terras, tende a se alinhar com o movimento anti-transgênicos. A pessoa tenderá a acreditar no que dizem os seus pares, não nos cientistas, não importa a quantidade de informação fidedigna que estes lhe possam aportar. Ela também não tem tempo, nem vontade e, em geral, nem o conhecimento, para digerir as informações científicas. O mesmo ocorre com alguém de outro grupo qualquer. Na verdade, não temos uma opinião inteiramente nossa, mas refletimos, muito mais, a opinião de nosso grupo. Fazemos isso porque somos parte de rebanhos, por mais individualistas que sejamos.

Os que militam no movimento antitransgênicos provavelmente julgam que o Dr. Coutinho, como todos os demais cientistas do main trend, seleciona as informações científicas de forma a só ver o que quer e despreza a opinião dos cientistas “independentes”. Esta ideia é repassada em seu grupo e comprada por todos os simpatizantes, sem questionamento.

No fundo, não somos muito diferentes dos alfas, betas, gamas e deltas do Admirável Mundo Novo: o Aldous Huxley apenas extrapolou num mundo imaginário o que ocorre hoje, e ainda com mais força, num mundo onde as redes sociais dão as cartas.


A conclusão: cada um seguirá dizendo aquilo que acredita e desqualificando os demais, como sempre foi, desde que o homem aprendeu a falar e talvez mesmo antes disso. Mesmo sem perceber que sua opinião é, de fato, a opinião do grupo de carneiros ao qual pertence. Que grupo vai vencer a “batalha” dos transgênicos? Provavelmente o da ciência, que vem amealhando vitórias faz muitos séculos. Espero viver bastante para ver isso.

Agrotóxicos e transgênicos – sinopse de postagens no GenPeace

Caros,

O assunto “Agrotóxicos e transgênicos” (e, em alguns casos, mais agrotóxicos que transgênicos...) foi tratado no Genpeace em várias ocasiões, com textos meus (sozinho ou em colaboração com colegas mais sábios) e em textos de terceiros. A maior parte foi em resposta à hipótese sem fundamento de que o aumento do uso de agrotóxicos no Brasil se deve ao aumento do uso de transgênicos. A turma que propõe esta ligação se esquece que:

a) só o glifosato (e em menor grau dois outros herbicidas) pode ter um aumento relacionado à expansão das plantas GM tolerantes a ele. Todas as plantas Bt e similares determinaram uma redução importante do uso de inseticidas. Mas mesmo o glifosato sempre foi e continuará sendo usado em uma infinidade de aplicações agropecuárias e é por isso que ele é o líder de vendas. Os demais herbicidas, inseticidas, fungicidas, vermicidas, etc., que estão computados no tal aumento de 200% em dez anos, nada têm a ver com as plantas transgênicas.

b) o aumento no uso de plantas transgênicas, de 2005 a 2014, foi de mais de 10 vezes! Que matemática é essa que iguala um aumento no uso de agrotóxicos em geral, que foi de 2X, com o das plantas GM, que foi de 10X?!!

c) o que de fato aumentou muito (umas 1,5 a 2X) foi a produtividade de nossa agricultura: com um aumento insignificante de área nossa produção aumentou 2X.
Para bom entendedor, a coisa é óbvia: a intensificação da agricultura promoveu um maior uso de agrotóxicos em geral. Mas a turma vai continuar insistindo nesta história da carochinha de aumento de agrotóxico devido aos infernais transgênicos; por várias razões...

Aqui está um sumário das postagens

1. Agrotóxicos: tamanho real do problema e não-relação com os transgênicos -  http://genpeace.blogspot.com.br/2015/03/agrotoxicos-tamanho-real-do-problema-e.html  
2. A adoção dos transgênicos na agricultura não aumentou o uso de agrotóxicos   http://genpeace.blogspot.com.br/2015/04/a-adocao-dos-transgenicos-na.html
3. Instituto culpa transgênicos por aumento no uso de agrotóxicos, sem provas; especialistas rebatem   http://genpeace.blogspot.com.br/2015/05/instituto-culpa-transgenicos-por.html  
4. Cientistas reafirmam ausência de correlação entre aumento do uso de agrotóxicos e aumento do uso de transgênicos: ativista erra nas contas e resvala na ética   http://genpeace.blogspot.com.br/2015/05/cientistas-reafirmam-ausencia-de.html  
5. Resposta detalhada às afirmações de Alan Tygel intituladas “Transgênicos: malefícios do mau uso dos dados e o diálogo mentiroso” publicadas em 11/05/2015 no Jornal da Ciência (SBPC)  http://genpeace.blogspot.com.br/2015/05/resposta-detalhada-as-afirmacoes-de.html  


De toda forma, para a CTNBio o assunto “agrotóxico” é, na prática, vetado pela lei 11.105, no seu artigo 39. Tudo que se refere a agrotóxico vai para a seara do MAPA, da ANVISA e do IBAMA. Mesmo quando a CTNBio aprova um produto que vai usar um agrotóxico, quem regulamenta isso não é ela e quem determina os níveis aceitáveis de uso, menos ainda. De toda forma, não há nada de “imoral” nisso: os níveis de agrotóxicos tolerados para uso em plantas transgênicas não são elevados (10 partes por milhão de resíduo no grão de soja, por exemplo, é o máximo permitido e resulta de limites estabelecidos por aplicações em quantidades rotineiras) e esta história de que as plantas GM foram feitas para tomar banhos de herbicidas é uma fantasia tremenda de alguns ativistas.

Prós e contras dos transgênicos na percepção pública e na avaliação de risco


Paulo Paes de Andrade
Departamento de Genética/ UFPE

Alguns questionamentos sobre as plantas transgênicas hoje no mercado brasileiro surgem sempre, de forma redundante. Muitos são voltados à questão do modelo agrícola brasileiro, outros envolvem o uso de herbicidas, outros ainda questionam os cientistas que não encontraram problemas com os transgênicos e alguns poucos estão centrados nos riscos diretos das plantas transgênicas à saúde e ao ambiente. Embora estes últimos questionamentos sejam os únicos que, de fato, me interessam integralmente, acabo me posicionando sobre os demais, nem sempre com a base técnica ideal. Isso pode me dar dor de cabeça no futuro, mas como sempre me consulto com os especialistas e leio o máximo que posso dentro do tempo que meu trabalho e demais atividades permitem, acho que não erro muito.
A postagem que se segue é baseada em vários questionamentos do Sr. Ruy Freire Filho (link), que gentilmente colocou suas opiniões no blog Tudo sobre plantas e as discutiu comigo. Creio que a ordenação e formalização textual destas respostas podem ser de alguma utilidade ao público interessado nos transgênicos e seu uso na agricultura.

1. Melhor seria se fôssemos um país agroecológico ou ao menos livre de transgênicos
Somos grandes exportadores de grãos. Se isso é bom ou mau, não sei, mas o país foi levado a isso por uma série de circunstâncias históricas, que envolvem o descaso com a educação, a concentração de terras, a aptidão agrícola, nossa vasta área e muitas outras coisas. Se quisermos competir no mercado internacional, tempos que seguir o que há de mais moderno na produção de grãos ou nossos preços não serão competitivos. Isso inclui a transgenia. Alguns argumentam que existe um mercado convencional grande (dos países que não compram transgênicos), mas este mercado é pequeno para o tamanho do nosso país. Outro modelo de agricultura (agroecológico, orgânico, etc.) pode fornecer suficiente grão para o consumo interno, mas duvido muitíssimo que possamos competir e exportar gerando a renda que hoje geramos.
Uma quantidade gigantesca de milho e soja é transformada na comida diária do brasileiro, diretamente (em geral através de produtos industrializados) ou indiretamente (através da pecuária). Grandes e médios agricultores também contribuem para a produção de outros itens da nossa mesa: arroz, batata, açúcar, laranja, café e por ai vai. Evidentemente o país possui também uma vasta área plantada por pequenos agricultores, agricultores familiares e cooperados, que produzem grande variedade de produtos agrícolas, em geral para o consumo in natura ou com pouco processamento. O Governo Federal apoia os dois tipos de agricultura e está certíssimo em fazer assim. Um país que quer garantir divisas com a agricultura e alimentar seu povo deve evitar polarizações tecnológicas e ideológicas e nosso país convive (nem sempre bem) com os modelos baseados em pequena agricultura e grandes produtores, facilitando o suprimento interno de alimentos e garantindo divisas. Também não devemos acreditar que os pequenos agricultores são os responsáveis majoritários pela mesa do brasileiro: não é assim – os pequenos, médios e grandes produtores, todos, garantem nossas refeições diárias com hortaliças e frutas, feijão, cebola, óleo, margarina, arroz, açúcar, café, sucos embalados e engarrafados, embutidos de todo tipo, biscoito, bolachas, cuscuz, canjica, macarrão, pão, leite, queijo, carne, vinhos, cerveja, cachaça e por aí vai, numa lista que inclui todos os agricultores deste país. É uma tremenda inverdade afirmar que 70 % do que comemos provém da pequena agricultura.

2. Compra de sementes e dependência tecnológica
 A compra de sementes a cada safra, no lugar do plantio de grãos, pode parecer ruim para o agricultor, mas não é assim: a cada ano novas variedades são lançadas, cada vez mais produtivas e adaptadas a cada nicho de terra de nosso país. Plantar grãos de uma safra na próxima não incorpora estes ganhos. Além disso, doenças e pragas podem facilmente ser propagadas quando se usa grãos como sementes e isso todo agricultor que planta muitos hectares de terra sabe muito bem. Daí a vantagem de comprar sementes. Mais uma vez, o cenário aqui é o de alta produtividade e o “lucro” com sementes melhoradas, mesmo que adquiridas de uma empresa multinacional, se espalha por toda a cadeia produtiva e para os consumidores. Isso é bem visível nos gráficos da Céleres (http://celeres.com.br/3o-levantamento-de-adocao-da-biotecnologia-agricola-no-brasil-safra-201415/) .
Por outro lado, o melhoramento é feito tanto pelas empresas privadas como pela EMBRAPA, e todas elas bebem da fonte do agricultor: há, sim, um diálogo contínuo entre o produtor e o melhorista, ao menos no Brasil. Cria-se, desta forma, uma certa interdependência entre os melhoristas brasileiros, os agricultores e as empresas multinacionais.
Ainda que o uso de sementes desenvolvidas por multinacionais seja muito difundido (e não apenas no agronegócio, é bom dizer), se os preços não forem vantajosos o agricultor escapa pela tangente, usando grãos como sementes e empregando sementes distribuídas pelo governo. A ninguém interessa um impasse comercial, onde o produtor de semente não consegue vender e o agricultor não consegue plantar.

3. Venda casada de sementes e insumos
A “venda casada” é um problema sério, mas o ubíquo glifosato (herbicida mais usado no Mundo, mesmo antes dos transgênicos) não é um caso típico: várias empresas produzem plantas tolerantes ao glifosato e muitas empresas produzem o glifosato, de forma que o conceito de “venda casada” não se aplica. O mesmo é válido para o 2,4-D, que é produzido por muita gente e para o qual muitas plantas GM de diferentes empresas estão sendo avaliadas pela CTNBio (sugiro uma leitura da última pauta da Comissão, que está sempre disponível no site da CTNBio). A venda casada ocorre desbragadamente em outros setores e os brasileiros raramente percebem...

4. Boatos e suspeitas sobre os OGMS
A questão do suicídio devido aos transgênicos pode ser descartada, seguramente (http://www.nature.com/news/case-studies-a-hard-look-at-gm-crops-1.12907) . Se o algodão GM é proibido em determinadas áreas da Índia, é muito mais uma questão política (e que envolve a percepção de risco) do que uma questão científica (e que envolve a avaliação de risco).
Quanto às superpragas, elas se devem ao mau manejo de pragas e não á tecnologia em si. Além disso, elas não são, na verdade, “super” em nada: a revista Nature, linkada acima, apenas adotou a linguagem usada na mídia popular.
Há um grande número de outros mitos e algumas suspeitas. A diferença entre estas duas categorias é que os mitos não têm qualquer base científica e as suspeitas derivam de trabalhos publicados, relatórios técnicos e outras formas de ordenar resultados de acordo com a praxe científica. Muitas questões pertinentes estão detalhadamente descritas na Wikipedia (https://en.wikipedia.org/wiki/Genetically_modified_food_controversies) e recomendamos uma leitura atenta.

5. Endividamento do agricultor
Os empréstimos bancários, seguros de compra e coisas assim fazem parte da agricultura moderna, como também da indústria inovadora. Mas começou a muito tempo atrás!  Isso é tão antigo como a agricultura brasileira e pode ser facilmente aquilatado lendo o bom “Fogo Morto”, do José Lins do Rego, no tempo que a agroindústria do açúcar estava em plena expansão no Nordeste. É quase impossível entrar no setor da agricultura moderna sem empréstimos, sobretudo se a escala for grande, mas isso nada tem a ver com a transgenia: aplica-se igualmente ao milho, à soja, ao cacau, ao café e por aí vai. E lembro: os royalties raramente ultrapassam 5% do custo da produção: combustível, água, adubos, pesticidas vários e mão de obra importam em custos muito, mas muito maiores mesmo. No fundo, o uso de sementes de alta qualidade é como a compra de sêmen de bons touros para melhorar a genética do rebanho. Não é necessário manter o touro e o benefício da boa genética chega do mesmo jeito.

6. A concentração dos lucros na agricultura
A divisão dos lucros na agricultura é péssima, concordo com os leitores. Mas é ainda pior entre os pequenos agricultores que, muitas vezes sem saber se organizar em cooperativas, entregam por quaisquer 10 réis seus produtos ao dono do caminhão. Ao menos os grandes produtores são tremendamente bem articulados no comércio global.

7. Valor de um trabalho publicado: o que sai em boas revistas é necessariamente bom?
 Um trabalho publicado numa boa revista não significa imediatamente que ele é um bom trabalho: revisores erram e algumas vezes as revistas têm interesse em publicar um artigo polêmico, mesmo que de baixa qualidade ou mesmo um embuste. Todos os anos centenas de artigos são retirados de circulação pelas revistas por várias causas (plágio é uma delas), e isso sempre ocorre porque a comunidade científica denuncia a fraude ou o erro. Foi o que aconteceu com o artigo de Séralini dos ratos com tumor. Sabiamente, a PlosONE suspendeu a publicação de uma nova fantasia do Séralini no último dia 18 (maio/2015) e o homem perdeu seu tempo com o já tradicional circo de press release: só os jornais sensacionalistas da mídia irresponsável na França compraram o embuste. Agora (dia 2 de julho) o artigo finalmente apareceu, mas as críticas de todos os lados (inclusive as nossas - http://genpeace.blogspot.com.br/2015/07/dissecando-o-novo-artigo-do-grupo-de.html)  já não lhe asseguram um futuro promissor.
Afinal, o que é então um trabalho sério (ou mais especificamente, quando um resultado se converte em fato)? Aquele que vai sendo confirmado por outros autores e que está baseado no método científico. Fora disso tudo mais é ilusão.
Para resumir: um resultado só vira um fato quando é corroborado por muita gente. Antes disso é só uma suspeita (se a metodologia for boa) ou um boato (se for ruim). Sobre este tema complexo sugiro a leitura de http://genpeace.blogspot.com.br/2012/03/vozes-isoladas-na-ciencia-quebra-de.html .

8. Os transgenes contaminam o milho crioulo e comprometem a biodiversidade
A “contaminação” de variedades crioulas de milho é assunto muito discutido. É a única que pode ocorrer no Brasil hoje. Mas os produtores de milho crioulo sabem muitíssimo bem manter a identidade de suas variedades, quando querem. Muitos deles também fazem trocas nas feiras de sementes orgânicas e embaralham tudo de novo, com imenso risco para as variedades existentes em cada região. Isso tudo foi cuidadosamente avaliado num livro sobre coexistência do milho GM e não GM que publicamos pelo MCTI vários anos atrás.
A “contaminação” comercial em milho é uma fantasia, sobretudo no replantio de grãos: todo agricultor sabe o que o vizinho está plantando e se insiste em usar para o plantio grãos colhidos a menos de 25 m da cerca do vizinho para o próximo plantio, ou é louco ou mal intencionado. Por outro lado, se alguém planta milho orgânico, tem que seguir as regras dos orgânicos, que exigem uma separação muuuuuito maior entre cultivos orgânicos e convencionais (sejam transgênicos ou não) do que pede a regra de coexistência da CTNBio. Há outras fontes de “contaminação”, como maquinário, caminhão, etc., mas isso foge ao nosso foco.
O Brasil e vários outros países mantêm bancos de germoplasmas que são os responsáveis pelos programas de melhoramento genético das plantas de interesse comercial. No caso do milho o centro de origem é na América Central e o Brasil e demais países fora desta área são, quando muito, centros de diversidade secundária. Além disso, não vejo como as plantas transgênicas poderiam causar mais danos ao milho original do que as variedades comerciais não transgênicas. O transgene em si só será fixado na população nativa se contribuir de forma muito importante para a seleção de grãos no novo plantio. Isso é um assunto complexo e que extrapola um pouco  o espaço aqui. A riqueza de germoplasmas de outras plantas independe do milho, claro.
No contexto do milho, não pode haver erosão genética como entendemos para espécies que se propagam sem a mão do homem. Pode haver perda transiente de diversidade, mas para isso existem os bancos de germoplasma, que são ordens de grandeza mais ricos do que o depósito de sementes dos noruegueses e de outros defensores estelares da Natureza.

9. Superpragas aparecerão em resposta ao uso dos OGMs
 Desde que o Homem ingressou na agricultura que o MIPT (Manejo integrado de pragas e tecnologias) vem sendo exercido, com maior ou menor sucesso, dependendo da base técnica, da pressão econômica e do clima. As pragas sempre driblam, com o tempo, qualquer técnica de controle exceto a destruição completa por fogo ou por máquina.  A tecnologia Bt pode ser superada pelas pragas, mas seu tempo de duração vai depender, como para qualquer outra tecnologia, da adoção de boas práticas agrícolas (que reduz o problema dos heterozigotos e também da subdosagem). É tão simples como isso e não há solução mágica.


10. Percepção de risco X avaliação de risco

O público vê os transgênicos com desconfiança. É difícil aquilatar até que ponto esta desconfiança muda o padrão de consumo e é possível que o preço, o sabor, a forma e outros elementos determinem a decisão de compra, muito mais do que o símbolo T, existente em milhares de embalagens e desconhecido da maioria dos brasileiros. Mas o órgão técnico que avalia os transgênicos, a CTNBio, não vê riscos adicionais nos produtos hoje no mercado. Esta é a diferença entre percepção do risco (de todos nós) e avaliação do risco (dos especialistas). Sugiro a leitura de um texto antigo meu sobre isso: http://genpeace.blogspot.com.br/2014/04/principio-da-precaucao-herbicidas-e.html

Por fim, fico feliz em discutir estas questões de uma forma civilizada com os leitores. Concordo que nosso país poderia ter seguido outro caminho no seu desenvolvimento, mas fomos empurrados para este beco por séculos de incúria quando o assunto era educação, que continua muito ruim. Nosso povo carece de instrução para trabalhar em indústrias de ponta, para se organizar em cooperativas e, de forma geral, para exercer seus direitos. Enquanto isso, tem que gerar renda para fazer o país progredir e ser um pouco menos ingrato aos brasileiros que virão. A biotecnologia tem ajudado nosso país a ter uma balança comercial positiva. Pode ser que em 20 anos a agricultura seja muito diferente do que é hoje e que o país ingresse na área industrial, deixando à agricultura um papel secundário na geração de riquezas. Aí, então, poderemos fazer uma agricultura mais equilibrada e menos produtiva. Mas hoje não vejo como desprezar a agricultura intensiva e, dentro dela, a biotecnologia.

APENAS 10 EMPRESAS DOMINAM 75% DO MERCADO MUNDIAL DE SEMENTES – E DAÍ?

Frequentemente lemos que umas poucas multinacionais dominam o mercado mundial de sementes e que isso seria um imenso risco à soberania alimentar dos povos. Mas será mesmo?

É preciso muita serenidade e certa clareza para entender a questão das sementes vendidas por empresas, sejam elas multinacionais ou pequenas companhias. Nada disso é novo e sementes são vendidas há mais de 50 anos. E sementes “livres”, aquelas fornecidas por órgãos de governo ou propagadas livremente pelos agricultores? Estas sempre continuarão existindo.

Sabendo disso, podemos nos perguntar: em que setor atuam as grandes empresas de sementes? No setor de commodities, ou seja, no setor de grãos que vendem muito pelo mundo todo. As sementes dos demais produtos agrícolas (frutas, legumes, verduras, grãos de menor expressão e outras plantas) também são vendidas por uma infinidade de empresas (inclusive as grandes), assim como podem ser obtidas de graça em muitos órgãos de governo ou pelo menos propagadas de graça. Também podem ser trocadas nas feiras de sementes da agricultura familiar. Finalmente, em muitos casos, os grãos podem ser plantados como sementes.

Então, o que está sendo explorado (mas de forma alguma controlado de verdade!) é o setor de commodities. Do mesmo jeito que celulares, computadores, carros, etc. Da mesma forma, sempre existirão alternativas aos produtores mais prestigiados... Além dos seis grandes há, como afirmamos acima, agências de governo, pequenas empresas, sementes crioulas e sementes de paiol, tudo acessível ou mesmo gratuito.

E, ao contrário dos carros e celulares, sementes e grãos podem ser propagados sempre que os preços não forem convidativos. Se a Monsanto e os outros grandes criam uma dependência do agricultor aos seus produtos (e tecnologias embutidas neles), elas também dependem do agricultor: se o preço for ruim ou a planta não emplacar, babau.

Se a gente olha com calma, não há a mais mínima diferença entre o mercado de sementes e muitos outros onde há concentração de produtos nas mãos de uns poucos e a qualidade do produto varia muito. Mas o Mundo não vai morrer nem sofrer com isso, porque a lei da oferta e procura escraviza igualmente produtores e consumidores, enquanto ela existir, independente de qualquer regime e de qualquer ideologia.

PS. Por que alguém compraria uma semente se pode obter de graça ou plantar seus próprios grãos? Os que combatem o mercado privado de sementes evitam fazer esta pergunta e assim escondem uma parte importante da discussão: a semente vendida só existe porque incorpora vantagens (e tecnologia) que a gratuita não tem. Se o agricultor entra num mercado muito competitivo (como o de grãos), terá que usar as melhores sementes e a melhor tecnologia para alcançar a produtividade necessária. Se ele atua num setor menos competitivo, pode usar uma semente de governo (boas variedades existem para o pequeno agricultor), sementes crioulas ou ainda propagar seus grãos, com as vantagens e riscos destes procedimentos. Em nenhuma destas sementes há tanta tecnologia embutida quanto a que existe nas sementes de grandes empresas. É o mesmo que comprar um Gol em vez de um Porsche ou construir seu próprio veículo em vez de comprar de algum fabricante. E da mesma forma, o Gol tem seu mercado, assim como o Porsche...


(esta postagem está baseada em um comentário que fiz ao site Controversia: http://controversia.com.br/18859?utm_source=wysija&utm_medium=email&utm_campaign=Boletim+Controversia )

quarta-feira, 29 de julho de 2015

CTNBio bota ordem na presença de público às suas reuniões: se você quiser saber como os transgênicos são avaliados na Comissão, não chegue de surpresa por lá.

Faz tempo que qualquer um podia chegar na hora das reuniões setoriais ou da plenária da CTNBio, colocar seu nome num papel na entrada e sentar-se para acompanhar os trabalhos. Mas muitos abusaram deste acesso e se organizaram em grandes grupos para tumultuar a reunião. Agora a Comissão, sem restringir o direito das pessoas em ouvir o que se discute lá, bota um pouco de ordem: serão precisas inscrições prévias, o número de vagas será determinado pela Secretaria Executiva em função de vários parâmetros , assim como a escolha dos participantes. O objetivo é evitar tumultos e garantir a presença da maior diversidade possível de participantes.


As regras, esclarecidas no site da Comissão e válidas já para a reunião de agosto de 2015, estão abaixo:

Inscrições para as Reuniões da CTNBio

Informações gerais:
1) Fica autorizada a presença de espectadores externos a Comissão nas reuniões ordinárias e setoriais da CTNBio;
2) O numero de vagas será determinado pela disponibilidade de assentos no local da reunião, após garantir espaço a todos os membros da CTNBio, equipe de assessores que dá suporte às reuniões, eventuais palestrantes, convidados e participantes com presença previstas em leis e regulamentos;
3)  As inscrições dos interessados seguirá os procedimentos determinados pela Secretaria Executiva da CTNBio;
4) Os espectadores externos não terão direito a voz, salvo mediante autorização da Coordenação da reunião ou convite formal para isso;
5) Os espectadores externos que poderão participar de cada reunião serão definidos pela Secretaria Executiva da CTNBio:
a. Considerando o número de assentos disponíveis, as justificativas apresentadas, segurança do local e a logística da reunião;
b. Mediante inscrição prévia pelo e-mail: reuniaoctnbio@mcti.gov.br
c. Procurando dar oportunidade para que representantes de diferentes instituições possam participar.

Procedimentos para Inscrição:
• Fazer inscrição prévia pelo e-mail: reuniaoctnbio@mcti.gov.br
• No momento da inscrição os dados pessoais dos interessados deverão ser informados:
1 - Nome;
2 - Endereço;
3 -  Telefone de contato;
4 - Número da identidade e CPF.

• Na inscrição deve-se indicar se a instituição a qual representa possui algum item na pauta em questão ou qual outro interesse específico em acompanhar a reunião;
• Indicar quais reuniões deseja-se acompanhar: (setoriais e/ou plenária)

A seleção dos participantes obedecerá os seguintes critérios:
o Ordem da inscrição;
o Disponibilidade de assentos na reunião escolhida (setorial/plenária);
o Inscrição de mais de um representante da instituição;
o Relevância do assunto a ser acompanhado.

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