terça-feira, 25 de março de 2014

Sobre enxadas e agrotóxicos, jumentos e carros

Que  toda tecnologia nova traz riscos, não há a menor dúvida. Assim também, a não adoção de uma nova tecnologia também traz riscos, com certeza. Vamos fazer uma metáfora rápida entre as enxadas e os jumentos e os herbicidas e os carros. Arabicamente, comecemos de trás prá frente.

Os carros introduziram no trânsito e na vida um elemento importante de risco. No Brasil os acidentes de
motos, carros e ônibus matam muito mais do que boa parte das doenças e não poupam crianças nem jovens. Se abandonássemos o uso de motos, carros e coletivos motorizados, sem dúvida alguma reduziríamos enormemente o número de vítimas do trânsito. A população teria que mudar sua forma de chegar às escolas, ao trabalho e ao lazer, mas com algum esforço e desprendimento, poderíamos substituir os veículos automotivos citados por jumentos, cavalos, burros e por carroças puxadas por mulas. Já foi assim e funcionava muito bem, nos bons tempos do Segundo Império. Seguramente a pressão das multinacionais empurrou goela abaixo dos brasileiros esta mania de carros, motos, ônibus, metrôs e caminhões. Afinal, para que servem os veículos automotores se não para fazer exatamente o que fazem os jumentos, cavalos e outros muares?

Exatamente para fazer um dos principais papéis da enxada, a saber - a capina, inventaram o tal de herbicida. Com ele, ao exemplo do carro, chega-se mais rápido ao fim do trabalho, mas os acidentes se multiplicam, ao sabor da falta de cuidado do agricultor, da mesma forma que no trânsito os acidentes dependem da falta de cuidado do motorista ou do pedestre. Estão certíssimos os que querem um Brasil livre desta tecnologia perigosa, que mata e polui da mesma forma que os veículos automotivos por combustível fóssil.

Muito bem, então vamos proibir todos os herbicidas e levar a agricultura do país na enxada. Sugiro que, na mesma época, façamos a troca dos carros por jegues e dos ônibus por carroças puxadas por mulas, proibindo também as motos. Assim teremos um país livre de agrotóxicos e de vapores de gasolina e diesel, buzinas e correrias, sem acidentes no campo ou nas cidades. Evoé!

É inútil fazer as contas para mostrar quão insensato é sumir com os carros, motos e ônibus, fora o fato de que ninguém quer ficar sem eles. Então, vamos fazer as contas para a substituição dos herbicidas por enxadas, enxadões, enxadecos, estrovengas, foices, cacumbus et caterva.

De acordo com o CONAB, temos uma área de aprox. 50 milhões de hectares plantada com grãos, onde se emprega uma mecanização intensa. Se tirarmos todos os herbicidas de circulação (na verdade, basta tirar 4 mais usados, inclusive o glifosato e o tordon), precisaremos ter 3 homens trabalhando por hectare (um homem por tarefa, que são 25 braças por 25 braças, pra quem não entende nada de lavoura arcaica), o que implica em ter 150 milhões de enxadas e todos os brasileiros no campo, fora os velhos e os menores de 10 anos.


Estupenda solução verde para nosso país. Ou esta turma não sabe fazer conta ou quer encolher a agricultura do país às roças pequenas, explodindo os preços no varejo e condenando o país à fome. Haverá falta de conhecimentos matemáticos ou será um complô para levar o país prá trás?

Transgênicos são tão seguros quanto melhoramentos convencionais

De Agrolink   21/03/14 - 11:23    Autor: Leonardo Gottems

Cientistas do Reino Unido enviaram um parecer ao Conselho de Ciência e Tecnologia aconselhando que o país reveja sua regulamentação sobre culturas geneticamente modificadas. “A maioria das preocupações quanto aos transgênicos não têm nada a ver com a tecnologia, que é tão segura quanto o melhoramento convencional”, afirmou um dos autores do relatório, Sir David Baulcombe, do Departamento de Ciências Vegetais na Universidade de Cambridge.

O Conselho é o órgão consultivo do primeiro-ministro britânico para assuntos científicos. No documento, os especialistas advertem que, se não houver uma regulamentação das culturas transgênicas em nível nacional, e não no nível da União Europeia, a produção agrícola pode sofrer grandes prejuízos. O relatório foi escrito por cientistas das universidades de Cambridge e Reading, e dos laboratórios Sainsbury e Rothamsted Research.

"As críticas mais frequentes estão relacionadas com a forma como a tecnologia deve ser aplicada e se é benéfica para os agricultores de pequena escala ou para o ambiente. Para responder a essas preocupações, é necessário ter um processo de regulamentação com base em provas e evidências, independentemente de quais tecnologias tenham sido utilizadas para o desenvolvimento”, sustentam.

“Como não há nenhuma evidência de riscos ambientais ou de toxicidade intrínsecos associados com cultivos transgênicos, não é apropriado ter um quadro regulamentar que se baseia na premissa de que os transgênicos são mais perigosos do que as variedades de culturas produzidas por cruzamento convencional de plantas”, diz o parecer.

Sugestões GenPeace - Leia também:

1.     David Baulcombe. It's time to rethink Europe's outdated GM crop regulations. http://www.theguardian.com/environment/2014/mar/14/europe-gm-crop-regulations
2.     Bruce Alberts e outros. Standing Up for GMOs. http://www.sciencemag.org/content/341/6152/1320.summary
3.     Genetic modification (GM) Technologies. Relatório e Revisão sobre os avanços em transgenia. https://www.gov.uk/government/publications/genetic-modification-gm-technologies

É claro que a oposição aos transgênicos já começou a achincalhar os autores do relatório, dizendo que têm fortes ligações com as empresas de biotecnologia. Nunca criticam efetivamente as conclusões dos artigos e relatórios, porque não sabem o assunto em profundidade, mas são experts em emporcalhar publicamente os cientistas. Leiam em http://www.dailymail.co.uk/news/article-2581387/Scientists-hidden-links-GM-food-giants-Disturbing-truth-official-report-said-UK-forge-Frankenfoods.html


domingo, 16 de março de 2014

Transgênicos: como o agendamento de mídia afeta a notícia

Que o agenda setting é determinado pelos grupos de poder, não há a menor dúvida. No caso dos transgênicos  (como em muitos outros, aliás) ele está ao sabor das prioridades e oportunidades de visibilidade e ganhos destes grupos. Mas raras vezes as posições dos vários grupos apareceram tão claramente refletidas nas manchetes de suas notícias como no caso da suspensão da venda do milho LL da Bayer nas regiões Norte e Nordeste. Fiz um trabalho de garimpo das notícias que apareceram até 48 h depois da decisão do desembargador do TRF4, em Porto Alegre, no dia 13 de março de 2014. Elas estão listadas abaixo, grupadas por afiliação do grupo.

Uma leitura atenta mostra que o Governo Federal em seu escalão mais alto (Portal Brasil) simpatiza com os que se opõem à biotecnologia agrícola: a manchete leva de imediato o leitor a imaginar que os milhos geneticamente modificados foram proibidos no Brasil. A leitura do conteúdo da notícia prova que só a metade da história, ou menos, está contada (ver http://genpeace.blogspot.com.br/2014/03/justica-proibe-venda-de-milho.html). O conteúdo da notícia é claramente uma cópia do que apareceu publicado nos blogs e portais das ONGs que estão perfiladas contra os transgênicos no país, ou suas simpatizantes. O alinhamento vai ao ponto de fazer constar na notícia apenas as declarações da Terra de Direitos, sem qualquer entrevista com a CTNBio, que é o órgão técnico do réu neste processo (a União). E não havia desculpas: a CTNBio estava reunida bem pertinho, no CNPq, exatamente no dia 13 de março...

O segundo portal do Governo é o da Justiça Federal. É evidente que eles foram imparciais e apenas notificam a decisão. Não cabe um jornalismo investigativo neste portal, que pudesse informar ao leitor muitas coisas que não estão na postagem citada acima e ainda o fato de que este milho nunca foi efetivamente comercializado por aqui (Gazeta do Povo, http://agro.gazetadopovo.com.br/noticias/agricultura/milho/veto-a-milho-transgenico-nao-afeta-mercado/ ).  A decisão de suspender a venda desta variedade “de gaveta” não é nova e já tinha sido comentada pela Abramilho muitos anos atrás (http://www.abramilho.org.br/noticias.php?cod=1039).  No fundo, a suspensão tem um mínimo impacto, tanto para criar jurisprudências como para afetar o mercado.

Os cinco primeiros portais de ONGs, todas alinhadas contra os transgênicos, têm chamadas parecidas ou idênticas e o conteúdo é essencialmente copiado do portal da Terra de Direitos. A notícia é apresentada, desde a manchete até o final do conteúdo interno, como uma grande vitória da oposição à biotecnologia agrícola, com frases e declarações que mais parecem palavras de ordem do que uma notícia. Nas notícias destes blogs, que creem fazer um jornalismo investigativo, não há sequer menção à derrota que o Idec, a AS-PTA, a Associação Nacional de Pequenos Agricultores e a Terra de Direitos sofreram no Tribunal: o ponto importante da ação era a suspensão das regras de coexistência e, consequentemente, da venda de sementes e plantio de milho transgênico no país, proibição esta que seria válida para todas as variedades!( http://aspta.org.br/campanha/663-2/; ver comentários em http://genpeace.blogspot.com.br/2014/02/meandros-da-coexistencia-entre-milho.html).  Com o veredicto, por unanimidade, esta pretensão está definitivamente soterrada.

O último portal de ONG é bastante mais neutro, estando a posição claramente refletida na manchete. Mas o conteúdo não é próprio, e sim copiado da Agência Brasil, uma mídia online. Aliás, as mídias online investigadas nesta janela temporal de dois dias após a sentença, sejam grandes ou pequenas, foram relativamente neutras, mas não chegaram ao cerne da ação nem investigaram a totalidade da decisão. Em outras palavras: falharam redondamente em trazer ao leitor uma informação completa.

Ao fim da tabela há o link para uma postagem de nosso blog, onde comentamos a decisão. Também não é completa porque não temos o processo nem a decisão em mãos e porque não somos juristas, mas fizemos o que estava ao nosso alcance para mostrar o lado B da notícia que constava no portal da Terra de Direitos.

Tabela 1:  Clipping de notícias disponíveis na internet até 48 depois da sentença do desembargador do TRF4, que suspendeu a comercialização do milho LL da Bayer no Norte e no Nordeste do Brasil. As notícias estão divididas por grupos de maiorias (ou grupos de poder). Como outgroup foi incluída a análise da notícia no blog GenPeace, que reflete a opinião de um grupo majoritário na CTNBio, mas que é essencialmente escrita pelo proprietário do blog.

Afiliação
Nome
Título da reportagem
Link
Governo
Portal Brasil
Tribunal impede liberação de milho transgênico
Governo
Justiça Federal
TRF4 proíbe comercialização de milho transgênico no Norte e Nordeste do Brasil
ONG
Terra de Direitos
Com voto histórico, TRF4 impede a liberação de milho transgênico da Bayer
ONG
MST
Com voto histórico, TRF4 impede a liberação de milho transgênico da Bayer
ONG
IDEC
Milho transgênico da Bayer não pode mais ser comercializado
ONG
Adital
Vitória contra a comercialização de milho transgênico
ONG
Pulsar - AMARC
Milho transgênico da Bayer tem sua liberação anulada
ONG
EcosBrasil
Justiça proíbe venda de milho transgênico no Norte e Nordeste
Grande mídia
Sergipe Agora
Justiça proíbe venda de milho transgênico da Bayer no Norte e Nordeste
Grande mídia
Gazeta do Povo (Londrina)
Veto a milho transgênico não afeta mercado
Mídia online
Agência Brasil  EBC
Justiça proíbe venda de milho transgênico da Bayer no Norte e Nordeste
Mídia online
Regional  Águas da Serra
Justiça mantém comercialização de milho transgênico no Sul do país
Pessoa física
Genpeace
Justiça proíbe venda de milho transgênico da Bayer no Norte e Nordeste do Brasil: e o que mais? Escondendo informação do público


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sábado, 15 de março de 2014

A CTNBio não decide diferente dos demais países que fazem avaliação de risco de transgênicos

Uma crítica que sempre se vê pela internet é a de que a CTNBio é irresponsável e que aprova no Brasil plantas transgênicas e outros OGMs que não foram aprovados nos países “sérios”. O corolário desta afirmação, que é completamente falsa, é obvio: o Brasil seria um campo de testes e os brasileiros, cobaias. Mas será assim?

Observemos o que está aprovado no Brasil. No banco de dados do CERA (http://cera-gmc.org/) constam 24 plantas transgênicas aprovadas no Brasil (há mais algumas no portal da CTNBio (www.ctnbio.gov.br), mas sempre soja, algodão e milho):
·         Quatro variedades de soja (duas da Bayer tolerantes ao herbicida glufosinato de amônio, uma da Basf, tolerante à imidazolinona e uma da Monsanto tolerante ao glifosato)
·         Sete variedades de algodão (Uma da Dow tolerante a insetos, duas da Bayer tolerantes a glifosato e quatro da Monsanto tolerantes a herbicida e/ou resistentes a insetos)
·         Treze  variedades de milho (cinco da Syngenta tolerantes a um herbicida e/ou resistente a insetos praga, quatro da Monsanto resistentes a insetos e/ou tolerantes a herbicidas,  uma da Bayer tolerante a herbicida e três da Pioneer e da Dow tolerantes a herbicida e resistentes a insetos).

Será que só nós, pobre tupiniquins, guiados pelos irresponsáveis professores e pesquisadores que sentam na CTNBio, aprovamos estes “venenos”? Ou talvez mais alguns países subdesenvolvidos, talvez ditaduras, tenham também aprovado, à revelia da segurança de seu povo?  Mas claro, nenhum país responsável faria isso...

Pois senão vejamos. Tomemos como exemplo dois milhos badalados, o NK603 e o TC1507. Observemos as tabelas abaixo, que mostram os países que os aprovaram, seja para plantio ou apenas para consumo (como alimento ou ração).

Tabela I. Países que aprovaram o milho NK603 (resistente a insetos), de acordo com o CERA database

País
Plantio
Alimento ou ração
Alimento
Ração

2004
2004

2002

2008
2008

2001
2001
2001

2005

2004

2009

União Europeia
2004
2004

2001
2001
2001

2002
2004

2002

2005
2003

2002
2002

2003

2000
2000

2011
2011

Tabela II. Países que aprovaram o milho TC1507 (resistente a insetos e tolerante a glufosinato de amônio), de acordo com o CERA database
País
Plantio
Alimento ou ração
Alimento
Ração

2005
2005

2003

2008
2008

2002
2002
2002

2004

2006

2009

2006
2005

2002
2002
2002

2002
2004

2003

2003
2003

2002

2003

2001
2001

2011
2011


Voilá! Estamos em companhia de países bárbaros e dominados por ditaduras sanguinárias ou somos parceiros de países sérios? Uma leitura rápida das duas tabelas mostra que os principais países e uniões do Mundo estão na lista dos que aprovaram estes dois milhos. O primeiro, entretanto, foi motivo de um estudo amalucado do Séralini e sua trupe (vejam http://genpeace.blogspot.com.br/2013/11/sepultando-um-zumbi-o-artigo-cientifico.html) e o segundo está no meio de uma polêmica na Europa entre a França e mais outros países e a União Europeia (http://genpeace.blogspot.com.br/2014/02/ao-desamparo-da-lei-oposicao-francesa.html) . A polêmica sobre estes milhos, completamente esvaziada de ciência, mas entupida de política, é o que leva uma parte dos “ecossocialistas” a condenar a biotecnologia agrícola. Seguramente, se observarmos que nas duas tabelas estão o Canadá, a Austrália, os EUA, a União Europeia e o Japão, é completamente disparatado dizer que a CTNBio está fazendo os brasileiros de cobaias, ao revés do resto do Mundo. É evidente que, na lista, estão os maiores produtores de grãos do Mundo. Por conseguinte, o Mundo está comendo milho transgênico, seja bicho ou gente. Então, como é que os oncologistas (inclusive os veterinários) não estão milionários tratando de uma legião de gente e bicho com câncer? Bom, a resposta é óbvia, mas os que se opõem aos transgênicos nunca a aceitam...

Ainda bem que a CTNBio está em boa companhia. Assim, ao menos teremos um consolo como ex-membros: quando os brasileiros forem extintos pelo consumo de transgênicos, o resto do Mundo vai junto, inclusive os poderosos. Sobrarão os franceses para repovoar a terra...