sábado, 28 de setembro de 2013

Transgênicos: pros e contras num diálogo hipotético com o público

Car@s.

Queria seguir com uma tradição no meu blog e discutir alguns pontos de vista sobre as plantas transgênicas, comuns a muitos brasileiros. Estes pontos de vista estão expressos em blogs, portais e comentários em outras mídias e creio que merecem, da parte de seus autores, certa reflexão aprofundada e uma pesquisa maior na literatura. Sei que isso representa tempo, mas numa sociedade de informação investir em conhecimento é importante, sobretudo quando se quer expressar publicamente as próprias ideias e posições, para depois não ser surpreendido por ter dito coisas sem base, movido pelo “achismo”.

Tomei emprestados trechos de uma carta que recebi e que reflete boa parte dos pontos de vista que andam espalhados na internet: sigo discutindo ponto a ponto. Está longa a postagem, mas pode acrescentar alguma luz (ou motivação para estudos) nesta história dos OGMs. Esta postagem complementa uma das mais acessadas deste blog, na qual segui a mesma abordagem: http://genpeace.blogspot.com.br/2012/11/transgenicos-pros-e-contras-perguntas.html.


Afirmação: Eu pessoalmente não sou contra toda a transgenia, mas sou frontalmente contra o uso desta tecnologia em ambientes que não sejam isolados. Acho que o uso de OGMs em ambientes abertos como são os agroecossistemas uma enorme irresponsabilidade.

Na verdade, não há um ambiente totalmente isolado depois que um produto é liberado comercialmente, mesmo que seja para uso industrial e esteja prevista a esterilização de tudo antes do descarte. Por que? Porque pode haver acidentes, vazamentos não intencionais das linhas de produção, etc. Vamos admitir, portanto, que qualquer OGM pode escapar, com maior ou menor probabilidade. Claro que no caso das plantas, não há escape algum, elas são levadas a campo de propósito. Mas o problema final é o mesmo: qual é o impacto da presença deste OGM na natureza?

As plantas GM que estão liberadas comercialmente são o milho, a soja e o algodão (há agora também o feijão e o eucalipto). A soja e o algodão são espécies exóticas, assim como o feijão e o eucalipto. A soja não tem qualquer parente silvestre com quem possa cruzar. O mesmo vale para o feijão e o eucalipto. O algodão pode cruzar com uma espécie nativa de distribuição muito restrita, mas os híbridos não são competitivos na natureza e a CTNBio determinou uma área de exclusão onde há esta espécie nativa. Por fim, o milho também é uma espécie trazida para o Brasil antes da chegada dos portugueses, mas os que estão espalhados no país são os trazidos depois, pela mão dos colonizadores. Pela antiguidade da cultura, há variedades crioulas no país, que devem ser preservadas, mas há também um gigantesco banco de germoplasmas mantido pelo CENARGEN que faz isso de forma muito eficiente e tem acessos guardados há mais de 50 anos, antes da introdução maciça dos milhos comerciais (variedades e híbridos não transgênicos), no final da década de 50. O milho não cruza com outra espécie de planta, exceto o teosinte, que não existe no Brasil e cuja introdução é proibida, pois é considerado planta invasora e daninha.Não há variedades crioulas de eucalipto e o feijão é quase autógamo e o risco de fluxo gênico para variedades locais é muito pequeno.

Assim, a principal causa de preocupação com o ambiente, que é a transferência dos transgenes e sua fixação em plantas nativas ou outras espécies valorizadas, não existe. O que poderia haver seriam choques tecnológicos (conflitos comerciais de uso), isto é, quem planta comercialmente uma variedade não GM ter sua safra “contaminada” com grãos GM. Para reduzir muito esta possibilidade foram estabelecidas regras de coexistência que têm funcionado bem. A gente houve acusações dos ambientalistas do Paraná e algumas vezes de outros estados, alegando esta contaminação, mas não há um único processo na justiça em que um agricultor mostre prejuízo e peça ressarcimento aos vizinhos. Por isso, considero que a coexistência é uma questão resolvida. A outra questão advinda do fluxo gênico é a “contaminação” do milho crioulo. Acontece que estas variedades já convivem com a imensa pressão de fluxo gênico dos milhos híbridos convencionais e continuam existindo muito bem, portanto, também é uma questão resolvida. Da mesma forma que no caso dos produtores de milho convencional, não há casos de processos na justiça onde um produtor de milho crioulo peça ressarcimento por prejuízos econômicos causados pelos milhos convencional ou GM. Por fim, a diversidade de variedades de milho está muito melhor preservada no banco de germoplasma do que em campo, por razões óbvias.

Saindo do fluxo gênico e entrando na seara das proteínas recombinantes produzidas e seus impactos na fauna e na flora, podemos dividir a questão em duas, bem simples: qual o impacto das proteínas inseticidas (geralmente Cry e suas variedades, mas em alguns casos VIP, todas derivadas do Bacillus thuringiensis) e qual o impacto das proteínas que conferem tolerância a herbicidas (há pelo menos três diferentes). As duas são proteínas muito comuns na natureza e essencialmente todos os animais têm contato com elas, nas suas fontes nativas, com ou sem alteração de alguns aminoácidos, no caso das variedades expressas nos transgênicos. Há centenas de estudos que comprovam a inocuidade alimentar destas proteínas para vertebrados e invertebrados. No caso das toxinas Cry e VIP, há um monte de estudos que mostram sua elevada especificidade para o grupo de insetos-alvo. Sempre se vai ouvir falar de uns poucos artigos que supostamente mostram o contrário, mas eles são vozes isoladas e, além do mais, metodologicamente muito ruins, algumas vezes propositalmente distorcidos para mostrar os resultados desejados pelos seus autores (sugiro a leitura de http://genpeace.blogspot.com.br/2012/03/vozes-isoladas-na-ciencia-quebra-de.html). Em resumo, todas as evidências indicam que o impacto destas duas classes de proteínas (e dos alimentos produzidos com os grãos GM) na saúde humana e animal e sobre a fauna, seja ela nativa ou não, é essencialmente nulo.

Afirmação: Há controvérsias quanto à segurança destes organismos e prezar pelo princípio da precaução seria totalmente sensato. Princípio, aliás, que o Brasil concorda ao ser signatário do protocolo de Cartagena.

Em qualquer tema tecnológico de grande alcance sempre haverá controvérsias, sejam elas geradas por incertezas cientificas (em geral a menor causa das controvérsias...), seja por oposição ideológica ou até mística (a maior parte dos casos). Tome como exemplo os que se opõem até hoje à vacinação obrigatória, à fluoretação da água, ao uso de anticoncepcionais, de lentes de contato, de celulares, e por aí vai. Se, pelo “princípio da precaução”, suprimíssemos as tecnologias acima, teríamos até hoje a varíola no Mundo e nos privaríamos de uma infinidade de coisas que torna a vida do homem moderno muito melhor do que a de nossos antepassados.

Quando se começou a fazer engenharia genética as incertezas eram muitas e na Conferência de Asilomar se estabeleceu um padrão bem rígido para experimentação com OGMs. Isso foi sendo paulatinamente reduzido e hoje se faz experimentos com OGM sem qualquer risco importante em milhares de laboratórios no Brasil e no Mundo. Por que? Porque as incertezas foram sendo reduzidas com o tempo. A mesma coisa acontece com as plantas GM: as incertezas vão diminuindo todo dia frente ao avanço do conhecimento científico e da observação do desempenho do produto na prática. Daí a precaução não necessita ser extrema, mas apenas na medida em que o risco existe. Concretamente, a avaliação de riscos de OGM deixou de ser algo pouco definido e ganhou status de metodologia internacionalmente definida. Para uma visão desta metodologia, visitem nosso guia de avaliação de riscos ambientais de OGM no link http://genpeace.blogspot.com.br/2013/09/guia-para-avaliacao-do-risco-ambiental_687.html.

Por fim, comentemos o Princípio da Precaução. No caso dos OGMs o que o Brasil tem que seguir por lei é o Protocolo de Cartagena (ver box abaixo). A definição deste princípio não é da nossa cabeça, mas do texto do Protocolo. Ele não diz que não devemos adotar a tecnologia se houver incertezas. Não é nada disso! O que ele diz é que, se houver evidências de danos sérios ou irreversíveis, não se pode postergar a adoção de medidas de prevenção. Só isso. Acontece que estas evidências não existem de fato. Usar um “princípio da precaução” criado na mente de cada um gera um cenário em que a adoção de qualquer medida é impossível.

Box 1: Princípio da Precaução no Protocolo de Cartagena

Frequentemente uma posição ou abordagem de precaução muito estrita em comparação ao que reza o Princípio 15 do Protocolo de Cartagena (http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf), conhecido como Princípio da Precaução. Este princípio passou a ser ius scriptum no Brasil porque o País assinou a Convenção sobre a Diversidade Biológica, por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - ECO/92, a qual foi aprovada pelo Congresso Nacional e promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm). Também está inserido na Lei Nº 11.105/05 (Lei de Biossegurança - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm). Logo em seu artigo 1º o Princípio 15 diz textualmente:

“De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado  pelos Estados, de acordo com as suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.”

A interpretação do Princípio da Precaução deve ser feita com cautela e sensatez. A certeza científica não deve ser estrita, ou seja, não tem sentido exigir certeza cientifica de ausência de risco, uma vez que risco é parte da vida; não existe risco igual a zero. Até o Princípio de Precaução não é isento de riscos e uma de suas interpretações mais extremas é: “Em caso de dúvida, nada faça!”.  A história mostra que os riscos decorrentes da interpretação restritiva do Principio da Precaução causam danos irreparáveis e irreversíveis. As milhares de mortes pela varíola nos 60 anos de proibição da vacina e a guerra da vacina no Rio de Janeiro no século passado são apenas alguns exemplos.


Afirmação: Discordo de que a CTNBio seja formada por uma maioria de pesquisadores e professores sérios. Na minha leitura todas têm algum vínculo com as grandes multinacionais e não são independentes. Mas há uma minoria alerta e combativa, muito corajosa, dentro dessa comissão.

Esta é uma afirmação muito frequente, mas a verdade é que poucos conhecem os nomes de quem senta na CTNBio. Contudo, isso não é nada complicado, basta visitar o site http://www.ctnbio.gov.br/index.php/content/view/2251.html, pegar os nomes e ir no Lattes (CNPq) (http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.do?metodo=apresentar) para ver o curriculum vitae de cada um.
Na CTNBio há claramente dois grupos, um que avalia os riscos baseado naquilo que a ciência oficial diz e outro que se baseia nos “cientistas independentes”. A maioria segue a ciência oficial, porque avaliação de risco tem uma base científica, embora não seja ciência pura nem experimental. Optar por seguir o que dizem os “cientistas independentes”, como o Séralini, a Carman, o Quist e mais umas duas dezenas de nomes, não tem nada a ver com coragem, mas com opção por esta abordagem, que responde a uma ideologia específica da minoria na CTNBio (os dois lados tem as suas ideologias, evidentemente). Eu poderia argumentar que coragem é assumir seu lado científico e ser chamado de vendido às grandes corporações, “reducionista”, incompetente, violador dos princípios constitucionais e dos acordos internacionais e por aí vai. Todas estas acusações são feitas pelos “corajosos” àqueles que trabalham ou trabalharam na CTNBio “do lado de cá”; são postadas na mídia, nos blogues da AS-PTA e de outras ONGs ligadas aos movimentos rurais, e copiadas e coladas em centenas de outros blogs, até traduzidas em outras línguas e espalhadas por ai. Fácil é ser corajoso metendo o cacete no trabalho e na seriedade dos professores e pesquisadores, quase todos funcionários públicos e na sua imensa maioria sem vínculo algum com as multinacionais (veja a constituição da CTNBio e seus membros em www.ctnbio.gov.br) ,  mas que ousam se opor à minoria “lutadora, independente e sem vínculos com as multinacionais”.


Afirmação:  Basear uma tecnologia dessas no princípio da equivalência substancial por exemplo acho um erro muito primário.

O princípio da equivalência substancial é reconhecido mundialmente pelas autoridades em alimentação e está consagrado no Codex Alimentarius. E, que fique bem claro, ele não é apenas a comparação de uma tabela de composição, como querem vender aos leigos o pessoal que se opõe aos transgênicos, mas uma metodologia bastante elaborada e  consolidada pela FAO, pelo OECD e por muitos outros colaboradores internacionais. Acontece que a avaliação de risco não se baseia apenas nisso, de jeito nenhum! A toxicologia das proteínas recombinantes expressas, o comportamento agronômico da planta, a biologia molecular e celular envolvida com o uso da proteína e muitas outras informações também pesam, e muito, na decisão final sobre inocuidade alimentar. O que não tem sentido fazer é um monte de ensaios alimentares se não há evidência de toxicidade aguda, de efeitos inesperados na planta e de mudanças na composição. Os ensaios alimentares não vão dizer nada de novo, sacrificam animais inutilmente e podem mesmo levar a coisas bizarras como o trabalho do Séralini com os ratos que desenvolvem câncer comendo milho GM. Se, como muitos afirmam, é um erro primário o uso do princípio da equivalência, então o Mundo inteiro erra. Além disso, quando adotamos novas plantas não GM, sejam variedades ou espécies novas, que o brasileiro nunca comeu antes, ninguém pede coisa alguma. Veja os exemplos da acerola, do quiwi, da quinua e de um mundo de outras introduções recentes (como o chocolate de cupuaçu, coisa que jamais algum índio fez e comeu, mas que foi imediatamente assumido como equivalente ao velho chocolate de cacau): todas estas coisas poderiam muito bem estar matando nossa gente, já que nunca foi feito um único ensaio de segurança alimentar de longa duração e de múltiplas gerações, inclusive com animais prenhes (como advogam para os GM os “corajosos” da CTNBio). Se usássemos o “princípio da precaução” como está escrito na cabeça de muitos, estas frutas e alimentos jamais tinham chegado ao mercado. Além disso, o quiwi é alergênico, o cupuaçu também, idem para o pêlo das plantas de acerola, a quinua tem importantes antinutrientes e por aí vai.


Afirmação:  Difundir informações de que a transgenia poderia acabar a fome do mundo apenas repete um discurso anacrônico e inverossímil da revolução verde.

Aqui o público está certo. Nenhuma tecnologia pode, sozinha, acabar com a fome no mundo, que é um problema conjuntural complexo. Mas a transgenia pode ajudar, e não atrapalhar, como querem fazer entender os que a ela se opõem. Pense com calma na nova geração de plantas GM que está chegando aí, tolerante a estresses hídricos e de solo, com melhor composição nutricional, etc. Entretanto, estas questões fogem um pouco da minha área de trabalho, que é avaliação de risco, e é melhor ser sucinto.


Afirmação: No Brasil 3/4 das plantas GMs são resistentes a herbicida(HT) que nada tem a ver com maior produtividade, exceto pela noção simplista e reducionista de que apenas eliminar "ervas daninhas" vá aumentar a produtividade.

Aqui quem está sendo simplista é quem sustenta este ponto de vista... (sobre reducionismo na CTNBio, vejam http://genpeace.blogspot.com.br/2012/05/maioria-e-reducionismo-na-ctnbio.html e http://genpeace.blogspot.com.br/2012/05/transgenicos-metodo-cientifico-politica.html). Este tipo de planta reduz gastos com máquinas, movimentação de solo, adubação e mão de obra. O agricultor não ganha em produtividade, mas reduz custos e tem mais lucro, e é por isso que a adoção da tecnologia é tão rápida. É como se fosse um carro que consome o mesmo que os outros, mas dá muito menos manutenção. Todos o comprariam, mesmo que fosse um pouco mais caro, porque em médio prazo já estariam lucrando.


Afirmação: Num país megabiodiverso como o nosso é vergonhoso que as monoculturas tomem conta de tanta terra.

Também acho. Mas o Brasil, porque nunca investiu seriamente em educação, acabou condenado a ser exportador de bens primários, inclusive agrícolas. A imensa área plantada no Brasil, contudo, nada tem a ver com a transgenia, mas com o modelo de economia para o qual fomos empurrados. Quem sabe se o PT sair da casca e investir em educação os mesmos 12 anos que andou zombando dela, nosso país não muda? Culpar os transgênicos disso não é “corajoso”, denota simplesmente falta de conhecimento básico de agronomia.


Afirmação: A monocultura é dependente de insumos externos. Replicamos isso desde as plantations do Brasil-colônia. 

Aqui a tônica é a mesma da resposta anterior: somos dependentes mesmo dos insumos, ainda que no Brasil colônia, ao contrario do que se afirma, não fôssemos: éramos dependentes de um mercado restrito imposto por Portugal, mas a tecnologia agrícola era desenvolvida pelos usineiros no Brasil e não vinha insumo algum de Portugal. Curiosamente, mesmo que se decidisse pelo abandono da monocultura e pela adoção maciça da pequena agricultura familiar, ainda dependeríamos fortemente de muitos insumos, inclusive sementes (só um leigo imagina que os pequenos agricultores usam sempre suas próprias sementes, isso é totalmente inverídico: também consomem agrotóxicos, adubos, sistemas de irrigação, tratores pequenos e um mundo de outros insumos e implementos importados ou que pagam royalties às multinacionais. Só não sabe isso que vive nas nuvens das urbes, longe do campo)

Afirmação: Existem tecnologias muito boas, que regeneram o meio ambiente, para produção alimentar, respeitando os padrões naturais que há tanto tempo seguimos.

Sem dúvida, há tecnologias alternativas que produzem alimentos sem um impacto tão grande no ambiente e sem tanta dependência de insumos importados. Mas o país nunca adotou estas tecnologias em grande escala ( e nem os pequenos agricultores, em sua esmagadora maioria, a adota)  e isso, mais uma vez, nada tem a ver com a transgenia! Ao contrário: nada impede (a não ser uma oposição caturra do MDA) que os transgênicos sejam adotados em sistemas agrícolas sustentáveis. Se alguém souber de uma razão concreta me diga. Tomemos como exemplo o feijão GM da EMBRAPA: adoraria ver um bom argumento pelo qual o pequeno agricultor que faz sua roça de forma sustentável (uma minoria notável) não deveria usar esta variedade GM. Pode até pegar as variedades GM das multinacionais: mesmo tendo que comprar a semente a cada safra, isto não é diferente do que já fazem os pequenos agricultores com milho, feijão, tomate, coentro, melão e por aí vai. A sustentabilidade nada tem a ver com a compra da semente, mas com o manejo agrícola. A compra da semente, por outro lado, garante sanidade e produtividade, como sabe todo agricultor, pequeno ou grande.

Afirmação:  Em nenhum aspecto vejo as PGMs como boas, a não ser que seja pra produzir algum produto a partir de seu metabolismo e dentro de um laboratório fechado, o que não é a regra.

Talvez os que se opõem à biotecnologia agrícola mudem um pouco sua posição no futuro, sobretudo com a entrada de novas plantas GM. Mas o fato de que os agricultores brasileiros adotaram em massa esta tecnologia, sempre que disponível, mostra que ela deve ter alguma vantagem importante para eles, por mais que os “corajosos” insistam em dizer que tudo é prejuízo e perda grave.

Afirmação: Aqueles que promovem a biologia sintética enxergam apenas essas tecnologias como salvação do mundo quando na verdade são os próprios propulsores de nossa decadência, da contaminação biológica e química sem precedentes.

A ideia de que a biologia sintética pode salvar o mundo é mesmo muito ingênua ou pretensiosa, mas daí a afirmar que seus promotores são os propulsores de “nossa decadência, da contaminação biológica e química sem precedentes”, vai uma grande distância. Mais uma vez, seria adequado que os que esposam esta ideia tivessem ao menos um exemplo concreto (não vale um caso retirado do fabulário da internet...); ficaria feliz em discuti-lo com os que trouxerem esta pérola do fundo do mar revolto da transgenia.
Muitos, quando afirmam isso, pensam nos herbicidas, mas eles eram, são e serão usados independentemente da transgenia. O que as plantas transgênicas fizerem foi mudar o tipo de herbicida mais usado, passando de uma mistura de herbicidas, alguma vezes muito perigosos, para dois ou três de classe de risco muito menor. E isso absolutamente nada tem a ver com a biologia sintética (recomendo a leitura atenta de http://scienceblogs.com.br/synbiobrasil/tag/biologia-sintetica/; para definições, veja também http://pt.wikipedia.org/wiki/Biologia_sint%C3%A9tica)

Paulo Paes de Andrade
Departamento de Genética
Universidade Federal de Pernambuco

Recife  PE  Brasil

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Debate sobre Alimentos Transgênicos: Prós e contras nas avaliações dos professores Paulo Andrade e Rubens Nodari

No dia 12 de setembro tive a oportunidade de oferecer um mini-curso de 4 hs sobre avaliação de risco e depois participar de um debate com o Prof. Rubens Onofre Nodari sobre a biossegurança de transgênicos. A oportunidade foi aberta pelos alunos que organizaram a IV Semana Acadêmica de Ciências Rurais (http://sacr.curitibanos.ufsc.br/) em 2013, no campus da UFSC em Curitibanos (http://curitibanos.ufsc.br/ ). Agradeço  a eles, de coração, todo o apoio que me deram.

No mini-curso segui essencialmente o que está na página do GenPeace em http://genpeace.blogspot.com.br/2013/09/guia-para-avaliacao-do-risco-ambiental_687.html . Creio que foi proveitoso. Havia um público impressionante de mais de 100 participantes. Os slides estão disponíveis em https://www.dropbox.com/s/7k0v7q5dr802v1g/Mini-curso%20SACR2013-%20biosseguran%C3%A7a%20de%20plantas%20transg%C3%AAnicas%20-%20Partes%201%202%20e%203%20.pdf.

O debate sobre transgênicos (http://sacr.curitibanos.ufsc.br/?page_id=160), iniciado à tarde, foi concorridíssimo, com mais de 200 pessoas vendo a apresentação do Prof. Nodari, seguida da minha.  Depois de uma pequena pausa o público encolheu um pouco, mas beirou os 80 quase até o fim das perguntas e respostas.

O Prof. Nodari seguiu o caminho que toma habitualmente nestas apresentações. Os slides da apresentação ainda não estão disponíveis, mas  há outras apresentações online dele que são parecidas; uma delas é a do link http://www.redes.org.uy/wp-content/uploads/2013/07/Participacion_ciudadana.pdf. Em lugar de se concentrar nos aspectos biológicos de risco, isto é, na avaliação de risco, o Dr. Nodari apresentou uma série de aspectos econômicos e sociais da tecnologia que não fazem parte da avaliação de risco e, sim, da análise de risco. Falou também da distorção que a CTNBio e todas as outras agências de avaliação de risco mostram no seu trabalho de avaliar os OGM e sugeriu que isto seja devido à forte pressão do econômico sobre o científico. Estes temas podem ser relevantes, mas são aspectos muito controversos, têm um viés ideológico muito forte e não se prestam para um debate onde sentam professores de genética (ele e eu, veja nossos CV em http://lattes.cnpq.br/1871521544483113 e http://lattes.cnpq.br/5792312135796017 ), ao invés de economistas, psicólogos ou sociólogos. Por isso, sistematicamente fugi destes temas, procurando trazer a discussão aos aspectos de risco dos OGM, tanto em minha apresentação (https://www.dropbox.com/s/wf4rt5uvoxlhrjb/Debate%20com%20Nodari.pdf) como nas respostas às perguntas do público.


Muitas perguntas foram feitas, respondidas inicialmente pelo Prof. Nodari e depois por mim. Não houve qualquer pergunta nova, o que foi discutido é o que já vem sendo debatido no Brasil e no Mundo (http://genpeace.blogspot.com.br/2013/05/biosseguranca-de-transgenicos-polemicas.html). Isso, naturalmente, é o esperado, e é bom que assim seja, pois demonstra que estas questões não estão resolvidas na cabeça do público. A oportunidade de mostrar pontos de vista divergentes é sempre muito boa e isso valoriza o debate, mesmo que acabe criando ainda mais dúvidas (coisa que os dois debatedores ressaltaram como positivo).

Do ponto de vista de biossegurança o debate se concentrou mais em dois aspectos gerais: o milho crioulo e a segurança alimentar dos OGM em geral. Houve outras perguntas sobre riscos biológicos relacionados à tecnologia (por exemplo, a questão dos agrotóxicos) e, em um caso isolado, eu comentei algo sobre o tema, uma vez que ele não se atém diretamente à questões dos riscos dos OGM per se. A concentração das perguntas nestes dois temas principais era também esperada: o milho é a cultura de sobrevivência por excelência e a questão de inocuidade alimentar é realmente transversal.

Uma das perguntas foi sobre um possível impacto negativo dos transgenes no milho crioulo. Procurei fazer ver ao público que a presença dos transgenes, em si, não é um problema para a biodiversidade (afinal, é um gene a mais...), mas a entrada de milhares de alelos melhorados provenientes das variedades e híbridos modernos, geneticamente muito mais homogêneos que os crioulos, isto sim, pode ser um problema, por reduzir a diversidade dos milhos crioulos.  Contudo, os agricultores souberam preservar suas linhagens durante mais de 50 anos de convívio com os milhos modernos, Também deixei claro que o milho não é nativo do Brasil e que nós não somos sequer centro secundário de diversidade e esclareci que a diversidade dos anos 50 está preservada no banco de germoplasma do Cenargen. Numa segunda pergunta sobre o mesmo tema também expliquei que mesmo num centro de origem o milho não é uma planta silvestre, ele só se propaga pela mão do homem; expliquei também que o parente silvestre do milho é o teosinte, mas que não há qualquer evidência de introgressão de transgenes em populações de teosinte. Neste instante o Prof. Nodari se levantou, colocou na tela dois slides para mostrar fluxo gênico e, de certa forma, tentar contrariar minha informação. E o que vimos?

O primeiro slide foi sobre um artigo que mostra a presença de transgenes em canola feral (atenção, não tem nada a ver com silvestre). O artigo é este aqui: Schafer et al. (2011)- The Establishment of Genetically Engineered Canola Populations in the U.S. PLoS ONE  6 (10): | e25736, 2011, disponível em http://www.plosone.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pone.0025736.
O artigo só avalia canola em beira de estrada: a presença de transgenes nestas plantas pioneiras ou escapes (ou, com bastante mais de liberdade de acepção, ferais) pode ser em parte devida à dispersão de sementes + posterior cruzamento, mas nada tem a ver com fluxo para parentes silvestres!  Tudo o que se mostra e se discute no artigo é só de Brassica napus para B. napus,  tudo muito provavelmente originado de escapes de transporte e outros mecanismos de dispersão das variedades cultivadas. Deixei claro depois da apresentação dele que eu conhecia bem o artigo e que o meu assunto era outro: passagem de genes para espécies silvestres, não para domésticas ferais!

Lendo posteriormente o artigo, o que interessa dele nesta discussão específica é apenas isso:
Populations of transgenic canola were denser along major transport routes, at construction sites and in regions of intense canola cultivation (Fig. 1). At a finer scale, feral populations appeared denser at junctions between major roadways, access points to crop fields and bridges, and intersections of roadways with railway crossings. At these sites, seed spill during transport is a likely mechanism for the escape of transgenic canola. Nonetheless, feral B. napus plants were occasionally found at remote locations far from canola production, transportation, or processing facilities. Populations were also observed at roadsides that had recently been mowed or treated with herbicide. Although our sampling protocol stipulated that a single plant be tested at each collection site, multiple sampling of additional plants revealed a mix of both herbicide resistant phenotypes, or a mix of herbicide resistant and vulnerable phenotypes in all randomly-tested large populations.”

A gente vê logo que não são populações silvestres, como quiz fazer entender o Prof. Nodari em suas argumentações distribuídas na internet  e repetidas no debate em Curitibanos, mas populações ferais, isto é, plantas comerciais que escapam do campo e vão crescer em ambientes não agrícolas próximos. Neste caso, estão na imensa maioria das vezes na beira de estrada. Devemos nos lembrar que nos EUA se usa com frequência herbicidas em beira de estrada para limpeza. Geralmente são herbicidas de largo espectro e, claro, selecionam fortemente as variedades tolerantes que apareçam na beira da estrada. Assim, é um cenário inteiramente artificial, dependente da ação do homem. Não há qualquer evidência no artigo de que os espécimes coletados longe das estradas também carregam os transgenes, embora mesmo isso não fosse prova alguma de fluxo de pólen a longa distância e coisas assim. É muito mais provável a dispersão de sementes comerciais por pássaros ou outros dispersores e, de toda forma, não tem qualquer implicação nas populações que verdadeiramente interessam: as plantas silvestres sexualmente compatíveis com a canola. Comparar os resultados deste artigo com um possível fluxo de transgenes do milho GM para o teosinte é errôneo. Entendo que isto ocorra por um entusiasmo excessivo pela causa contra os transgênicos, o que é natural (e positivo) dos combatentes ambientais.

O outro slide que ele apresentou mostrava um artigo que segue pela mesma linha do anterior e é sobre arroz: Chen et al. (2004) - Gene Flow from Cultivated Rice (Oryza sativa) to its Weedy and Wild Relatives. An. Botany 93: 67 - 73. (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/14602665). Eu também já conhecia este artigo, que não traz surpresas ao avaliador de risco e só pode causar alguma polêmica se apresentado como o Dr. Nodari o fez: como se o artigo mostrasse que na Natureza os transgenes escapam do arroz para espécies silvestres. Deixei claro depois da apresentação do Dr. Nodari que o artigo só mostrava fluxo de genes importante entre o arroz comercial e suas variedades consideradas daninhas (o arroz vermelho, o preto, etc.). Não há demonstração no artigo, nem referência na literatura, de que na Natureza os transgenes podem ser encontrados introgredidos no parente silvestre (Oryza rufipogon, no caso da Ásia), que é silvestre, até porque o arroz transgênico ainda não está liberado comercialmente em parte alguma do Globo. Nas condições muito particulares do experimento (todas as plantas a 50 cm de distância umas das outras) pode haver uma taxa muito baixa de cruzamento entre as duas espécies de arroz, mas isto em nada prova que os híbridos com O. rufipogon seriam minimamente competitivos em condições silvestres. Mais uma vez, a comparação entre o caso do arroz e o do milho é disparatada, embora mais semelhante que o caso da canola.

Dois outros temas foram trazidos à discussão.
a)         DNA dupla fita circulante e seu (im)possível impacto na saúde humana
b)        O caso dos ratos com tumor!

Nestes dois temas nossas opiniões foram frontalmente divergentes. Mas concordamos em outros pontos:
a)      A promessa tola de que os transgênicos vão acabar com a fome no Mundo.
b)      A questão da produtividade dos milhos crioulos: quem sabe disso são os especialistas neste tipo de milho, a CTNBio se manifestou num assunto que não é de seu domínio e errou.

Estes assuntos serão tratados numa próxima postagem. Quando estiver pronta trago os links para cá.


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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Guia para a Avaliação do Risco Ambiental de Organismos Geneticamente Modificados – Prefácio, Introdução, Capítulo 1, Apêndice (Protocolo de Cartagena) e Referências - uma contribuição à discussão sobre biossegurança de transgênicos

Caros leitores

Finalmente oferecemos, em versão online, a parte inicial do nosso Guia para a Avaliação do Risco Ambiental de Organismos Geneticamente Modificados. Os editores desta obra, publicada em 2012 pelo ILSI-Brasil e disponível na íntegra no formato pdf em http://cibpt.files.wordpress.com/2012/11/guia-avaliac3a7c3a3o-risco-ambiental-ogm-2012.pdf, foram os Professores Paulo P. Andrade (UFPE, Brasil), Wayne Parrott (UGA, EUA) e Maria Mercedes Roca (Escola de Zamorano, Honduras).

O conteúdo agora disponibilizado representa o consenso sobre a metodologia de avaliação de risco no Mundo e permite ao leitor o fácil acesso às informações e links relacionados, disponibilizados nesta versão online. Esta parte do Guia também esclarece, de forma inequívoca, a tarefa do avaliador de risco, retirando dela as questões sócio-econômicas ligadas à análise de risco, de maior abrangência. O texto online foi completamente revisto e atualizado, com importantes adições como, por exemplo, os critérios pra determinação das classes de probabilidades e danos na tabela de classificação de riscos (item 1.4). Por fim, adicionamos aqui também um apêndice sobre o Princípio da Precaução, links, comentários sobre artigos científicos, outros guias, relatórios técnicos e portais que têm interface com o tema tratado. O texto, quando impresso, ocupa aprox. 25  páginas em formato A4.

Estamos seguros que o conteúdo agora disponível online será de grande valia não apenas aos avaliadores de risco, mas a todos os que se interessam por biossegurança de transgênicos. O guia desmistifica a avaliação de risco, mostrando que o processo está muito bem estruturado e que leva a conclusões sólidas sobre riscos, se seguido fielmente. Desejamos a todos uma excelente leitura.

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Guia para a Avaliação do Risco Ambiental de Organismos Geneticamente Modificados – Prefácio, Introdução, Capítulo 1, Apêndice e Referências.

Prefácio



Os produtos da engenharia genética são conhecidos como transgênicos ou como Organismos Geneticamente Modificados (OGM). O Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, derivado da Convenção de Biodiversidade, também os define como “Organismos Vivos Modificados” (OVM), ou seja, organismos geneticamente modificados com capacidade de reprodução. Um OGM é qualquer organismo vivo, inclusive plantas cultivadas, que possua uma combinação nova de material genético, obtida através as técnicas da biotecnologia moderna. Uma vez que a maioria dos cultivos foi modificada geneticamente de uma forma ou outra ao longo da história, a melhor designação deveria ser “transgênico” sempre que a modificação incluir a transferência de genes entre diferentes taxa. Entretanto, o termo “OGM” está amplamente aceito como termo oficial e será, portanto, empregado neste guia.

O uso de OGM, ou cultivos geneticamente modificados (GM), na agricultura e em outros setores da produção, continua aumentando globalmente devido às vantagens que traz ao setor produtivo e ao consumidor. Por outro lado, o desenvolvimento e o uso desta tecnologia exigem o compromisso de não trazer novos riscos ao ambiente onde serão introduzidos. No caso de cultivos, o ambiente é o agroecossistema onde se esperam cultivar os OGM, além dos ecossistemas vizinhos.

Da mesma forma como se observa em outras áreas que requerem a avaliação de riscos, a biossegurança na biotecnologia apresenta aspectos interdisciplinares fundamentais característicos da análise de risco. Por sua vez, a análise de risco como disciplina científica compreende a avaliação de risco, assim como a gestão de risco e, por fim, a percepção e a comunicação de risco.

A avaliação de risco ambiental de OGM avançou consideravelmente durante a primeira década do século XXI, mas até hoje não havia sido publicado um texto resumido, claro, conciso e prático sobre esta nova disciplina. Este guia representa um esforço coletivo em nível latino-americano para ordenar de forma simples e eficiente a avaliação de risco que os países devem realizar, sem comprometer o meio ambiente nem prejudicar seu desenvolvimento econômico.

A tomada de decisões correta deve ser fundamentada em uma avaliação de risco robusta, que faça as perguntas corretas. O guia consta de duas seções: a Seção 1 está centrada exclusivamente na avaliação de risco, que deve ser realizada sobre bases científicas; contudo, para fins didáticos será também discutida a análise de risco como disciplina, com o intuito de fornecer ao leitor o contexto dentro do qual se encaixa a avaliação de risco. A Seção 2 (que não está apresentada nesta postagem, mas pode ser acessada no link indicado no início deste texto) inclui exemplos que seguem as instruções do guia passo a passo, enfatizando a segurança ambiental dos cultivos geneticamente modificados que já se encontram em comercialização em muitos países.

É importante enfatizar que as recomendações contidas neste guia estão em completa sintonia com as recomendações para avaliação de risco delineadas no Artigo 15 e seu Anexo III, do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança da Convenção sobre Diversidade Biológica (http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf). Por fim, embora este guia enfoque principalmente os cultivos geneticamente modificados, cumpre ressaltar que a metodologia e os princípios aqui delineados são igualmente aplicáveis a qualquer OGM.

Introdução

Historicamente, as atividades humanas sempre tiverem um considerável impacto sobre o meio ambiente. Entre as atividades destaca-se a agricultura que, na sua missão de assegurar a alimentação da população, também contribuiu para o desmatamento, para a extinção de espécies, para a erosão dos solos e para a contaminação das águas e de outros recursos naturais. O século passado terminou trazendo uma nova percepção sobre a importância dos recursos naturais e sobre a necessidade de conservá-los; atualmente é preciso também considerar ser imprescindível o uso sustentável dos recursos naturais para que a humanidade conte com os meios necessários para sobreviver, mesmo quando a população ultrapasse os nove bilhões de habitantes. Por todas estas razões, novas tecnologias vêm sendo desenvolvidas, que buscam corrigir os efeitos nocivos da agricultura do passado sem gerar novos danos, procurando assim reduzir os impactos ocasionados pelas práticas agrícolas convencionais.


A modificação genética convencional dos cultivos teve um papel muito importante através dos séculos, aumentando a produtividade agrícola e melhorando a qualidade dos alimentos. O próprio Charles Darwin, em sua “Origem das Espécies”, registrou que os cultivos mantidos há mais tempo em nossas hortas foram tão modificados que é hoje quase impossível reconhecer os antepassados silvestres que lhes deram origem (veja o link http://ebooks.cambridge.org/ebook.jsf?bid=CBO9781139107365  para o livro The origin of cultivated plants de Alphonse de Candolle; para a história da domesticação da cenoura, sugerimos http://www.carrotmuseum.co.uk/history.html; para uma visão dos derivados de Brassica oleracea, ver http://en.wikipedia.org/wiki/Brassica_oleracea). De início a modificação se deu pela seleção dos fenótipos mais desejados e o cruzamento entre eles. No século passado, adicionou-se a este processo seletivo a metodologia científica derivada do conhecimento das Leis de Mendel, o que levou ao estabelecimento de uma nova disciplina, conhecida como melhoramento vegetal. A ela se incorporou ao fim do século passado a engenharia genética, que emprega a transferência ou a modificação de genes (ou sequências de DNA) entre organismos mediante o uso de técnicas de DNA recombinante (rDNA) para incorporar novas características às plantas, o que teria sido impossível ou muito difícil de obter através de técnicas convencionais. Há inúmeros paralelos entre a produção de uma nova variedade e a produção de um evento geneticamente modificado (GM), como mostrado na Figura 1.


Figura 1: Comparação entre o processo de melhoramento convencional e a produção de um evento GM elite. O evento elite, por sua vez, será incorporado num programa de melhoramento convencional para a transferência da construção genética a muitas variedades. Em ambos os casos, começa-se com um grande número de plantas, que vai sendo progressivamente reduzido segundo critérios seletivos de comportamento agronômico. Em cada etapa restam os indivíduos com as características desejadas e se descartam todos aqueles que não passam nos critérios de qualidade. Devido a este estrito processo de seleção, é pouco provável que um OGM problemático chegue a ser comercializado. A figura para o melhoramento convencional é uma modificação de http://www. generationcp.org/plantbreeding/index.php?id=052.







Definição de Evento
A palavra “evento” é muitas vezes empregada para falar de um OGM. Um evento é simplesmente um OGM derivado de uma única célula transgênica, ou seja, de uma única transformação. Outros OGM podem ser criados independentemente no mesmo processo de transformação e terão o mesmo transgene, mas em outras posições no genoma e, portanto, são “eventos” diferentes. Como a integração de um transgene no genoma ocorre ao acaso em cada célula, não há dois OGM derivados independentemente que tenham o transgene na mesma posição do genoma. Por isso, cada OGM derivado independentemente é denominado um evento. É comum criar centenas ou mesmo milhares de eventos, dos quais somente um é selecionado para fins comerciais.


O conceito de biossegurança

No fim do século passado iniciou-se a adoção, desde então sempre crescente, dos OGM, primeiro na produção em contenção de fármacos (p.ex., insulina humana) e pouco depois na agricultura e em outras atividades produtivas. A perspectiva que se tinha na década de 1980, quando a tecnologia foi lançada, era a de que a humanidade teria a possibilidade de gerar novos organismos que de outra forma jamais existiriam na Natureza (sobre esta perspectiva errônea, veja box abaixo), o que originou preocupações quanto à possível transferência das modificações genéticas às espécies sexualmente compatíveis e quanto ao possível impacto destes organismos na fauna e na flora. No âmbito agropecuário, esta preocupação se estende também à coexistência entre as variedades geneticamente modificadas e as convencionais e com a biota em geral. As considerações que circundam o tema da aplicação desta tecnologia na agricultura podem ser agrupadas em várias categorias que incluem, de forma ampla, preocupações com a inocuidade ou aptidão alimentar, segurança ambiental, implicações éticas, culturais e de impacto socioeconômico.

O conceito de biossegurança, que surgiu ao fim do século passado, é a resposta às preocupações de inocuidade alimentar e de segurança ambiental. A biossegurança é um conjunto de políticas, normas e procedimentos adotados e constitui a aplicação de princípios científicos que dirige a forma rigorosa de avaliar os riscos associados a possíveis novos perigos derivados da adoção da biotecnologia; se os riscos de fato existirem, define métodos eficazes para a prevenção e mitigação de potenciais impactos negativos que poderiam derivar desta tecnologia. O objetivo fundamental de um sistema de biossegurança é prevenir, manejar, mitigar, minimizar ou eliminar os riscos à saúde humana e animal e proteger o meio ambiente de danos devidos a agentes biológicos utilizados em pesquisa e no comércio. No caso deste guia, os agentes biológicos são os OGM, embora haja outros enfoques de biossegurança mais amplos que incluem outras aplicações. A biossegurança em seu contexto mais geral inclui componentes legais, científicos, técnicos, administrativos e institucionais.

OGM: novos organismos ou velhos conhecidos com novas características?

A Humanidade sempre sonhou com organismos fantásticos, inteiramente novos ou combinados com partes dos organismos que a Natureza lhe oferecia. Este sonho está espelhado nas várias mitologias e, recentemente, no cinema e na literatura. Os produtos da engenharia genética forma, desde o início, vendidos ao público como organismos inteiramente novos, na media em que, de uma forma geral, a Natureza não os poderia ter criado. Por isso, cada vez que alguém sem intimidade com a biotecnologia vê uma planta ou um animal transgênico surpreende-se em ver que é igual ao organismo não transgênico que lhe é familiar.
De fato, um OGM não é um organismo novo, mas um organismo comum, com o qual convivemos há milênios, apenas transformado geneticamente para conter alguns genes a mais, naturais ou sintéticos, que podem ter origem em outros organismos. Estes novos genes conferem ao OGM alguma nova propriedade, desejada por razões econômica, nutricionais ou de pesquisa, mas para todas as demais características continua idêntico ao organismo parental. É, portanto, descabido imaginar que os OGM são organismos inteiramente novos. São, muito mais, uma quimera em que uma ou algumas poucas características foram adicionadas a um organismo bem conhecido. Ainda assim, um OGM está muito longe de ser a quimera ou o Pégaso da mitologia grega.



Desde o início, os OGM foram submetidos a rigorosas avaliações de risco relacionadas ao uso como alimento ou a sua liberação no ambiente, previamente à sua comercialização. Com pequenas diferenças nas quantidades e classes de alimentos consumidos em cada região do globo, a aptidão ou inocuidade alimentar per se é de caráter universal (veja http://genpeace.blogspot.com.br/2012/05/seguranca-dos-transgenicos.html) ). Esta universalidade não é a priori aplicável à inocuidade ambiental e por isto esta deve ser avaliada para os ecossistemas representativos dos locais onde se espera semear o cultivo, ainda que várias informações possam ser transportadas de outros ecossistemas (veja box sobre transportabilidade, mais adiante).

O primeiro capítulo descreve como se deve levar a cabo uma avaliação de risco como parte integrante da análise de risco; nos capítulos seguintes (só os primeiros dois capítulos estão disponíveis nesta postagem) encontram-se os outros componentes da análise de risco, além de outras informações pertinentes à avaliação de risco ambiental.



Análise de risco e avaliação de risco no contexto deste guia

A análise de risco é o uso sistemático da informação disponível para guiar a tomada de decisões, com base nos riscos e benefícios avaliados, da adoção de uma tecnologia em particular. Esta análise considera principalmente os aspectos de biossegurança, os quais são determinados por uma avaliação de risco. A análise de risco consta de três partes:

Avaliação de risco é o processo científico de estimar níveis de risco (ou, mais comumente, classificar os riscos) para cada perigo associado a um OGM. Depois de identificar metas de proteção, consiste no uso sistemático da informação disponível para identificar possíveis perigos, sua probabilidade de ocorrência (isto é, de concretizar-se em dano) e estimar as consequências deste dano, para em seguida inferir com certeza aceitável sobre a inocuidade da nova tecnologia num determinado ambiente e sobre a saúde humana e animal. A inocuidade se refere à carência ou a existência apenas de riscos insignificantes associados ao produto. A avaliação de risco, sendo científica, ela própria não considera os aspectos sociais e econômicos consequentes à adoção da tecnologia; alguns países incluem esta preocupação na análise de risco.
Manejo/ gestão de risco é o processo de definir ou propor estratégias para prevenir, mitigar ou controlar os riscos em níveis aceitáveis. Estabelece restrições e medidas de controle que devem ser adotadas.
Comunicação de risco é o intercâmbio interativo de informação entre os diferentes atores sobre os possíveis riscos e seu manejo, assim como dos benefícios, para que se tomem decisões informadas. Envolve um diálogo aberto entre os reguladores, os detentores da tecnologia, os tomadores de decisão e o público. Como requisito mínimo, os argumentos favoráveis e contrários aos OGM devem ser baseados em dados e argumentos científicos seguros.



A avaliação de risco considera para fins de estimativa (ou classificação) dos riscos exclusivamente os perigos (ou “possíveis ameaças” – veja box abaixo)  que forem demonstrados como biologicamente factíveis e que se prestam a uma avaliação científica usando métodos empíricos. Baseia-se no delineamento de perguntas sobre riscos cientificamente fundamentados e não em possibilidades especulativas que respondem primariamente a uma curiosidade ou inquietação pessoal, para poder ao final estimar o nível de risco que cada perigo apresenta.



O Perigo no contexto da avaliação de risco

Há diferenças na severidade de um perigo, mas o português e o espanhol não têm as palavras para nomeá-las. Em inglês, a análise de risco usa a palavra “hazard”, o que não tem equivalente em português ou espanhol, razão pela qual se costuma traduzir como perigo ou ameaça. Mas o perigo é mais comumente traduzido para o inglês como “danger”, sendo “danger” o mais alto grau de perigo. Ameaça costuma ser traduzida como “threat”. Perigo é usado aqui por conveniência, não porque capte o significado exato de «hazard.» Na verdade, a palavra «hazard» deveria ser traduzida como
«possíveis impactos negativos» ou como «possível ameaça», termos menos fortes, mas que melhor traduzem o sentido correto.


A inferência do nível de risco é feita com base na probabilidade de ocorrência de perigo identificado e a gravidade dos danos que pode causar. A relação entre as duas variáveis é que permite estimar um risco e, caso ele não seja aceitável, permite também desenvolver recomendações para o controle, mitigação e, de forma geral, seu manejo.

Já a análise de risco inclui, além da avaliação de risco, outros fatores que podem ser pertinentes. Um dos mais úteis é a avaliação do risco/benefício, que é feita comparando os possíveis efeitos positivos e negativos, com base no que se conhece das práticas convencionais ou atuais. Na análise de risco deve-se também considerar a complexidade e os custos das medidas de gestão de riscos: se for necessário gerir riscos a posteriori, as medidas propostas para a gestão devem ser claramente proporcionais ao potencial de dano e probabilidade de ocorrência (isso é, aos riscos avaliados); para tal se deve proceder previamente a uma análise consistente, sólida, séria e argumentada, tanto dos efeitos da liberação do OGM quanto os da sua não adoção. Na verdade, o Protocolo de Cartagena inclui a possibilidade de incorporar considerações socioeconômicas para complementar a tomada de decisões na análise de risco (veja box sobre o assunto mais abaixo). Este tem sido o procedimento adotado por alguns países, como a Argentina, que inclui na análise a possibilidade de que as exportações possam ser adversamente afetadas pela aprovação e plantio do OGM.

Conceito de Risco


A diferença entre um perigo e um risco é um conceito fundamental na avaliação de risco. Uma definição muito geral de risco é a probabilidade de que um dano ocorra e suas possíveis consequências.
O conceito de risco tem um significado diferente segundo as características sociais, culturais e econômicas de quem o percebe. Também tem significados diferentes para a mesma pessoa em diferentes momentos e depende da situação particular em relação a uma determinada inquietação. Por isso é importante enfocar a avaliação de riscos objetivamente nos fatores que possam ser cientificamente medidos.
Perigo (“hazard”) é efetivamente uma ameaça hipotética. Dano é o impacto real caso o perigo se materialize e risco é uma estimativa da probabilidade de ocorrência do perigo e da magnitude do dano esperado:
Risco = probabilidade de ocorrência do dano x consequências

Nenhuma atividade humana, por mais simples que seja, apresenta risco nulo: inclusive, a falta da atividade pode implicar em maior risco.




Capítulo 1    

Avaliação de risco ambiental



É conveniente apresentar as etapas da avaliação de risco em um esquema para destacá-las das demais ações inerentes à análise de risco, que serão apresentadas no próximo capítulo (todo o Guia está disponível no link indicado no início desta postagem). A ideia geral é identificar perigos novos, ou seja, aqueles devidos à modificação genética e não associados ao produto convencional (ou não geneticamente modificado), para, em seguida, avaliar a possibilidade de que esses perigos se materializem e causem danos. A Figura 2 resume os passos da avaliação de risco. Os primeiros dois passos compõem a formulação do problema; no passo 3, com base numa rota ao dano, são identificados a probabilidade de ocorrência e o dano potencial associado a cada novo perigo listado no passo 2; este passo é essencial para o descarte dos perigos que não são novos ou são improváveis, ou ainda que não se prestam a uma avaliação, reduzindo assim a lista de perigos significativos que devem ser avaliados. O risco de cada perigo restante é estimado com base num algoritmo qualitativo tabular amplamente utilizado na avaliação do risco (Passo 4), que inclui a probabilidade de ocorrência e a extensão estimada do dano potencial. Havendo risco, na etapa 5 determina-se se ele é aceitável ou se pode ser manejado para reduzir, evitar, mitigar ou minimizar seus efeitos. Em todos os exemplos apresentados neste manual, os ícones mostrados na figura 2 serão apresentados ao início de cada item, indicando em que passo da avaliação o leitor se encontra.

Figura 2: Relação entre os passos da avaliação de riscos, indicados no texto.


1.1 Formulação do problema na avaliação de risco ambiental (passos 1 e 2)

A comparação dos riscos apresentados pelos cultivos GM deve ter como ponto de referência o comportamento das variedades tradicionais conhecidas, em situações semelhantes de cultivo. Como mostra a Figura 2, a formulação do problema compreende dois passos: a definição do contexto e o estabelecimento de uma lista de perigos, conhecido também como definição do problema.


Primeiro passo: o contexto


O contexto é o primeiro elemento da formulação do problema e inclui o ambiente receptor e as atividades humanas relacionadas ao uso do OGM. Também inclui considerações sobre a construção genética do OGM e suas características biológicas. É importante considerar o comportamento previsto do OGM em seu entorno, assim como suas formas de reprodução e propagação (a biologia do organismo homólogo
convencional e seus usos).

O contexto também inclui as metas de proteção definidas pelos marcos legais do país. Como as metas de proteção dependem do marco legal, da biologia do organismo e do ambiente receptor, não é possível formular uma lista de metas específicas aplicáveis a todos os casos, mas é possível identificar temas gerais dentro dos quais se enquadram as perguntas específicas para cada caso. Por isso, foram incluídos diversos estudos de caso na Seção 2 deste guia, para demonstrar os princípios de avaliação aplicados em diferentes situações. A formulação do problema, se executada corretamente, garante a qualidade da avaliação de risco ambiental para a tomada de decisão (Wolt et al., 2010). Finalmente, é preciso manter claro em mente que não é o impacto universal de um OGM que está sendo avaliado, mas apenas os efeitos que diferem daqueles ocasionados por organismos semelhantes, mas não GM, em uma determinada região.

A formulação do problema compreende cinco elementos principais:

a A identificação de metas ou objetivos de proteção relevantes à avaliação, as quais deveriam idealmente estar descritas no marco legal ou regulatório, assim como em outros documentos pertinentes às políticas públicas de proteção ambiental do país. Estas metas, comumente, incluem objetivos muito gerais, como a proteção da biodiversidade, da saúde humana e animal e dos agroecosistemas. Esta complexidade precisa ser reduzida através da seleção de elementos chave representativos dentro do conjunto das metas de proteção.

Embora não seja possível uma lista definitiva de metas de proteção, seguramente alguns elementos são frequentemente encontrados nas avaliações de risco, tais como proteção a espécies ameaçadas ou icônicas, preservação ou melhoria da qualidade da água e dos solos, proteção a espécies benéficas para a agricultura e proteção dos recursos genéticos do país (p.ex., variedades locais ou espécies crioulas). Estas metas são efetivamente uma primeira etapa na redução operacional da complexidade do ambiente receptor.


A biodiversidade e as metas de proteção


Há várias generalidades nas metas de proteção, ou seja, naqueles elementos do ambiente que se deseja proteger, no caso específico, dos efeitos possíveis ou comportamentos indesejados de um OGM. Estas metas muitas vezes se encaixam dentro da categoria da biodiversidade. Contudo, a biodiversidade é um conceito muito amplo e complexo. Assim, para poder avaliar riscos é imprescindível, primeiramente, identificar os aspectos da biodiversidade que podem ser ameaçados pelo uso do OGM e que sejam também mensuráveis. Estas metas de proteção mais específicas são denominadas pontos finais de avaliação (assessment endpoints)
Os pontos finais de avaliação podem ser definidos como “uma expressão explícita e precisa do valor ambiental que se quer proteger” e devem ser mensuráveis. Do ponto de vista operativo, os pontos finais de avaliação são definidos como uma entidade ambiental que pode ser susceptível de dano, associada a algum atributo que proporciona a evidência do dano. Por exemplo, as abelhas são uma entidade ambiental valorizada e sua abundância nos agroecossistemas é um atributo importante. Assim, a abundância das abelhas em um determinado agroecossistema pode constituir um ponto final de avaliação para uma meta de proteção mais geral, como a biodiversidade.




b Conhecimento da biologia do organismo homólogo convencional e seus usos, com ênfase na descrição das características do homólogo convencional (não GM), que ajudam a predizer o comportamento do OGM. Normalmente há publicações que descrevem adequadamente a biologia do organismo parental (homólogo convencional não GM) e seu uso. O propósito é o de identificar características biológicas que pudessem causar um efeito adverso. Por exemplo, se um cultivo não GM cruza facilmente com um parente silvestre, a versão GM também o fará, razão pela qual ter-se-á que avaliar as consequências do fluxo de genes. Em outro exemplo, se um cultivo tem sementes que sobrevivem muitos anos no solo, um ensaio confinado com a versão GM do cultivo precisa incluir precauções para que as sementes não caiam no solo ou monitorar plantas voluntárias nas safras seguintes.


Mecanismo de propagação


O mecanismo de propagação ou reprodução de um OGM pode influir em seus possíveis efeitos, já que este é um aspecto que influencia os níveis de exposição ao OGM. As principais variáveis que se devem considerar para um cultivo GM em relação ao mecanismo de propagação e reprodução são:
a Se o cultivo é anual ou perene, neste último caso permanecendo no campo por muito tempo.

b Alguns cultivos são autógamos, cujo pólen é pouco móvel. Os outros são alógamos e tem o pólen mobilizado pelo vento, por insetos, ou por outras vias, o que aumenta a distância de dispersão do pólen. É fundamental conhecer a biologia do pólen (viabilidade, mobilidade, entre outros). Outro mecanismo de dispersão importante é através de sementes.
c Há espécies que se propagam de forma vegetativa em seu cultivo, mas que têm a capacidade de produzir pólen ou sementes. Para estes cultivos existem condições (horas de luz e faixas de temperatura) que fomentam o cruzamento sexual.
d Finalmente, há cultivos que se propagam exclusivamente de forma vegetativa, como a banana, pois são estéreis em todas as condições. Neste caso, não há oportunidade para fluxo de pólen, mas pode acontecer a persistência no solo de tecidos com capacidade reprodutiva.




c A caracterização do ambiente receptor do OGM em avaliação. Inclui-se aqui a identificação de organismos chave que poderiam sofrer danos devido à presença do OGM. Entre estes estão os organismos sexualmente compatíveis com o OGM. Quando o produto do transgene é uma toxina (p.ex., o Bt), também se deve assegurar que a proteína produzida não provoque danos aos organismos não alvo que pudessem ser eventualmente susceptíveis a esta toxina. Estes organismos devem ser representativos de todos os possíveis organismos não alvo em um dado agroecossistema.


Organismos não alvo


Há um equívoco comum em relação á palavra toxina, já que frequentemente se supõe que uma toxina é automaticamente tóxica para todo e qualquer organismo. Não é assim: primeiramente, é preciso lembrar que muitas toxinas só são tóxicas para certas espécies. Por exemplo, a teobromina, encontrada no chocolate, é inócua para seres humanos, mas umas poucas barras de chocolate têm suficiente teobromina para matar um gato ou um cachorro. Portanto, a seleção de organismos cuja susceptibilidade eventualmente será testada depende do modo e escala de toxicidade apresentada pelos OGM. Por exemplo, um determinado cultivo Bt produz toxinas que afetam exclusivamente certos lepidópteros ou certos coleópteros. Uma lectina, por outro lado, pode ser tóxica a uma gama mais ampla de artrópodes e até a vertebrados.

Cabe destacar que mesmo que um organismo seja susceptível a uma toxina produzida por um OGM, não existe um risco se o organismo não estiver exposto à toxina. Por exemplo, uma lagarta pode estar frequentemente exposta à toxina num cultivo Bt, mas não um inseto aquático. Finalmente, a toxicidade depende, naturalmente, da dose.

d A construção genética, com ênfase na expressão dos transgenes e nas alterações fenotípicas esperadas consequentes à transformação genética. Embora seja frequente fornecer e analisar toda a informação sobre o vetor (a construção genética), nem toda a informação fornecida é necessária à avaliação de risco.

De fato, há alguns detalhes da construção que são informativos para a avaliação. Por exemplo, o nível de risco pode ser distinto se o transgene é expresso continuamente ou em determinados momentos, ou se é expresso em todos os tecidos da planta ou apenas em algum tecido. Da mesma forma, o organismo do qual se originou o gene usado na transformação genética também pode ser importante, já que alguns organismos podem ter características indesejáveis e é fundamental saber se o gene transferido não é justamente o responsável por algumas destas características.

Outros detalhes, como o mapa e os elementos que compõem o vetor e o mapa de restrição, não contribuem de nenhuma forma para a avaliação de risco. Esta informação é fornecida com o propósito de permitir o desenho de protocolos para detecção do evento, que não é parte da avaliação de risco. O método de transformação também é irrelevante, uma vez que a metodologia nada informa sobre a inocuidade ambiental. Até o momento não foi identificado qualquer risco específico associado a uma dada metodologia de geração de OGM.


Conceito de familiaridade segundo o Conselho
Nacional de Pesquisa da Academia de Ciências dos EUA


Desde os primórdios da agricultura, praticamente todos os cultivos foram geneticamente modificados, empregando métodos convencionais via seleção e cruzamento. É importante ter em mente que qualquer que seja o possível impacto ambiental a ser avaliado, ele será relacionado à característica conferida pela modificação e não ao método (convencional ou por meio da engenharia genética) que foi empregado para produzir a modificação genética. Por isso, é adequado e útil tomar como base para comparações o organismo modificado por fitomelhoramento convencional para fazer predições sobre o comportamento de um OGM sob determinadas situações de cultivo, segundo o conceito de familiaridade (NAS, 1989). Este conceito estabelece que “os cultivos modificados pela engenharia genética não devem apresentar riscos distintos daqueles apresentados pelos cultivos modificados através do fitomelhoramento convencional para características similares e quando cultivados em condições similares”.

Este conceito também se aplica a modificações ocasionadas por fatores de transcrição ou pelo silenciamento de genes, que por sua vez podem regular a expressão de muitos outros genes. O melhoramento convencional frequentemente lança mão de características devidas a mutações em genes reguladores, que normalmente se expressam em determinados momentos e condições (Parrott et al., 2010). Nunca foram detectados indícios de que a alteração de genes reguladores obtida por engenharia genética possa apresentar riscos diferentes daqueles apresentados pela mesma alteração obtida pelo melhoramento convencional.






Conceito de fluxo de genes


Tanto os cultivos convencionais como os OGM podem fazer cruzamentos com outras variedades do mesmo cultivo ou ainda com espécies sexualmente compatíveis. A este evento se denomina fluxo de genes, às vezes incorretamente referido como ‘contaminação‘. Após o cruzamento, o novo gene pode vir a estabelecer-se e fixar-se depois de várias gerações em outras variedades ou espécies sexualmente compatíveis (introgressão).

A ocorrência de um simples cruzamento não significa fixação do gene numa outra população. Para que se produza fluxo de genes, e subsequente introgressão, os seguintes eventos devem ocorrer:
1. Cruzamento com espécies sexualmente compatíveis ou outras variedades da mesma espécie: para que isso ocorra, ambas devem estar próximas e apresentar fenologias similares para que no momento da polinização exista receptividade; além disso, a progênie deve ser viável.
2. Em geral, para que o gene permaneça na população, ele deve conferir uma vantagem seletiva à progênie (p. ex., resistência a insetos praga).

3. O gene deve estar presente em gerações sucessivas (introgressão).

A presença de fluxo de gene, e mesmo a eventual persistência do gene na nova população, não significa automaticamente que haja algum risco. É indispensável avaliar os possíveis efeitos que a presença do gene possa ter na espécie na qual se introduziu através do cruzamento, assim como sua interação com outros organismos do seu entorno. Estes conceitos estão discutidos em maior detalhe na Figura 3.
Um caso concreto que bem ilustra tanto o conceito de familiaridade como o de fluxo de genes é representado pelo teocinte, que cresce há milênios ao lado do milho, assim como pelas raças de milho que cresceram lado a lado por muitos séculos; embora esteja bem documentado que o milho e o teocinte cruzam entre si, da mesma forma que as várias variedades de milho crioulo, e ainda que haja evidências de que este cruzamento resulta em fluxo de genes, nem por isto houve dano ao teocinte ou às várias variedades de milho crioulo.




e O histórico de uso de um evento ou de eventos semelhantes em outros países ou no mesmo país. Embora seja certo que não existam dois ambientes idênticos, há certamente condições ambientais que são comparáveis, o que permite fazer inferências sobre os resultados esperados da liberação de um OGM.




1.2 Segundo passo: definição do problema (lista de perigos)

Uma vez estabelecido o contexto, o passo seguinte é a definição do problema, ou seja, uma lista ou inventário de todos os perigos que poderiam acontecer se o OGM fosse liberado no ambiente receptor. Neste passo o avaliador não deve ainda se debruçar sobre a avaliação dos riscos associados a cada perigo, nem formular hipóteses que possam explicá-los, mas tão somente listar perigos, por mais improváveis que pareçam, que possam ser atribuídos à introdução do OGM no ambiente receptor, levando em consideração o contexto detalhado no passo anterior. O resultado deve ser uma lista de perigos que representem diferentes enfoques à questão específica da introdução do OGM, baseada na experiência acumulada de avaliações de risco anteriores de OGM similares, ou baseada em informação científica proveniente de outras fontes, independentemente do seu conteúdo ou qualidade. Uma vez estabelecido o contexto (passo 1) e definida a lista de perigos (passo 2), a formulação do problema está encerrada.



Categorias frequentes de perigos


Ainda que as perguntas específicas sejam distintas para cada OGM, há categorias gerais de perigo que podem ser consideradas. Como exemplo, estão apresentadas abaixo as categorias de perigo associadas a um cultivo GM.
Perigos de caráter geral associados a um OGM

Aumento do nível de adequação ou adaptação (“fitness”) do OGM a diferentes ambientes
• Maior fecundidade
• Comportamento invasivo (“invasiveness”)
• Tendência a adquirir características de planta daninha (“weediness”)
Impactos sobre espécies sexualmente compatíveis
Fluxo de genes que altere adequação ou adaptação de espécies potencialmente receptoras


Perigos associados à produção de toxinas pelo OGM

Impacto sobre organismos não alvo suscetíveis à toxina
• Artrópodes, especialmente os benéficos à agricultura, associados com o OGM
• Outros invertebrados, especialmente de solo
• Vertebrados associados com o OGM
• Microrganismos do solo
Outros impactos
• Acumulação de toxinas não inativadas no solo
• Alteração da biodegradação dos restos culturais do OGM


Perigos associados a um OGM tolerante a herbicidas

Incentivo a práticas agronômicas indesejáveis (p. ex., falta de rotação de culturas)
• Uso de certos herbicidas ou mudanças na quantidade aplicada


Perigos à tecnologia GM (não ocasionam danos ao ambiente fora da área agrícola, mas podem requerer monitoramento)

Para OGM produtores de toxinas
• Seleção de pragas resistentes
Para OGM tolerantes a herbicidas
• Seleção de plantas daninhas resistentes
A evolução de resistência é uma situação frequente na agricultura e requer o uso de boas práticas agrícolas (com monitoramento) para retardar ao máximo seu aparecimento. Para maior informação sobre o conceito de monitoramento, ver Capítulo 3.


1.3 Terceiro passo: caracterização do risco
O passo seguinte da avaliação de risco é a caracterização do risco, ou seja, a determinação da rota pela qual um perigo a um objeto de proteção possa causar o dano esperado. A análise deve levar em conta, inicialmente, a exposição do objeto de proteção (e, mais especificamente, do ponto de final de avaliação) ao perigo e, em caso de haver exposição, sua intensidade, quantidade ou duração. Deve levar em conta, na outra extremidade da rota, os possíveis danos associados. E, naturalmente, deverá estabelecer uma sucessão de hipóteses baseadas em ciência que levem do perigo ao dano através de etapas consecutivas. Para cada etapa estimar-se-á a possibilidade de que seja verdadeira e ao final a probabilidade de que a rota ocorra será o produto destas probabilidades.

Nem todos os perigos identificados na etapa anterior serão relevantes para a avaliação de risco. Para alguns haverá um fundamento biológico e para outros não será possível estabelecer uma lógica causal que os relacione com o OGM (isso é, uma rota ao dano cientificamente plausível). A escolha dos possíveis perigos cujos riscos serão avaliados deverá se basear num claro fundamento científico para cada perigo e na experiência prévia de outros países com o OGM em questão. Neste processo pode acontecer que o avaliador necessite de informações específicas que não haviam sido inicialmente fornecidas pelo desenvolvedor do OGM. Perguntas de caráter meramente especulativo ou que só satisfazem à curiosidade ou temor pessoal ou de algum grupo não são adequadas nem relevantes na avaliação de risco.


Carência de dados e a necessidade de ensaios confinados
Uma vez que os OGM apresentam um conjunto novo de genes, seu comportamento deve ser averiguado em condições de biossegurança. Por isso, é necessário observar o OGM em condições controladas de confinamento por um período adequado. Durante este período de observação, pode-se determinar se o OGM mostra algum comportamento não esperado. Além disso, os dados obtidos nas observações em confinamento servem para instruir a avaliação de risco. Estas liberações (conhecidas no Brasil como liberações planejadas) são sempre prévias à finalização da avaliação de riscos para fins de liberação comercial e sem elas pode haver falta de dados, sem os quais não seria possível efetivamente concluir a avaliação de risco.

Os ensaios confinados (liberações planejadas) são aprovados apenas depois do claro estabelecimento de medidas que assegurem que o OGM não poderá escapar do confinamento, medidas estas identificadas através de uma avaliação de risco prévia. No caso de cultivos GM as medidas podem incluir, por exemplo, distâncias mínimas de separação entre a área com OGM e os cultivos convencionais (não GM), ou a eliminação de estruturas reprodutivas (flores, rizomas, etc.). Podem incluir também o monitoramento das safras subsequentes para eliminação de sementes extraviadas que estejam germinando como plantas voluntárias. Quando as áreas são mecanizadas, ou bem se emprega maquinaria exclusiva para a área GM ou a maquinaria é totalmente limpa antes de ser empregada num campo não GM.
Os passos que devem ser seguidos para obter a liberação comercial de um OGM dependem da regulamentação de cada país. Em alguns países, se os ensaios confinados não indicarem problemas, pode-se avançar para a liberação comercial. Em outros, o OGM passa ainda por uma etapa semicomercial prévia.


As consequências da exposição ao OGM são avaliadas através de medidas de parâmetros apropriados e dependem em grande parte da frequência e da duração da exposição. Por isso, neste passo, as duas ações (probabilidade e caráter da exposição e, em havendo, magnitude das consequências da exposição, ou seja, dos danos novos associados ao OGM, mas não à sua contrapartida não GM) devem ser levadas a cabo simultaneamente. De praxe, as informações publicadas em livros e revistas científicas de renome (que foram submetidas a uma revisão por experts) e confirmadas por outras publicações de igual qualidade, assim como as avaliações de risco e relatórios das agências reguladoras de OGM de outros países, são fontes imprescindíveis de dados.

É fundamental estabelecer quais são os parâmetros dos objetivos de proteção que serão avaliados, denominados pontos finais de avaliação (assessment endpoints) reconhecendo, igualmente, que a complexidade do contexto não permite que todas as variáveis sejam avaliadas. Por exemplo, o impacto ambiental negativo devido ao cultivo de uma planta resistente ao ataque de certos insetos pertencentes à ordem Lepidoptera, via a produção no OGM de uma proteína inseticida (p. ex., Bt), poderia ser avaliado através de muitos parâmetros (p. ex., o impacto multitrófico sobre insetos que parasitam o inseto alvo), além das variáveis de fato relevantes (p. ex., o impacto sobre um organismo não alvo susceptível), mas os dados adicionais gerados não seriam muito informativos. A escolha de uma ou mais espécies não alvo que representam adequadamente o risco pode parecer difícil, mas atualmente há uma ampla experiência nesta área específica da avaliação de risco (Gielkens et al., 2012; Romeis et al., 2013). Por outro lado, dados relevantes podem ser obtidos de ensaios realizados em outros países, sempre e quando as condições dos ensaios forem compatíveis com as do país que quer adotar a tecnologia (veja box abaixo). Uma rota ao dano para estabelecer as etapas que determinam a relação causal entre um perigo e seu dano associado está exemplificado na Figura 3 para um caso específico hipotético.


Transportabilidade de dados e avaliações de risco:
o conceito de familiaridade segundo o Protocolo de Cartagena


O Artigo 13 do Protocolo de Cartagena reconhece implicitamente e aprova o conceito de familiaridade. Na concepção do Protocolo, o conceito se refere à familiaridade com certos eventos de OGM que já foram submetidos a uma avaliação de risco em outros países. Em virtude do Artigo 13, as Partes poderão adotar procedimentos simplificados para a autorização de importação de OGM. Segundo o Artigo 13, item 1(b), as Partes podem, inclusive, eximir certos OGM do procedimento conhecido como Acordo Prévio Informado.

Em outras palavras, as Partes podem recorrer à avaliação de riscos e à análise de risco já realizada em outros países. Se a autoridade responsável pela avaliação de risco de um país Parte do Protocolo tratou de riscos ambientais similares, outra Parte pode aceitar e confiar na avaliação de risco da primeira Parte. Além disso, as Partes podem utilizar a avaliação de riscos de outro país para esclarecimentos e redução do elenco de perigos identificados a fim de evitar a duplicação de esforços na etapa de avaliação de riscos.

Um entendimento frequente é de que, pela adoção de procedimentos simplificados em atendimento ao Artigo 13 do Protocolo, as Partes também cumprem com as obrigações previstas no Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (Acordo SPS) da Organização Mundial do Comércio. Em virtude do Artigo 4 do Acordo (denominado “Equivalência”), as Partes se comprometem ao reconhecimento mútuo de normas equivalentes. Quando as Partes usam o que estabelece o Art. 13 do Protocolo, reconhecendo uma avaliação de risco conduzida em outro país Parte, elas também cumprem com suas obrigações internacionais, tanto previstas no Protocolo de Cartagena como no Acordo SPS.

Como forma suplementar de aquisição de informação para subsidiar a avaliação de risco de OGM, as Partes podem também recorrer à informação disponibilizada pelo Centro de Intercâmbio de Informações em Biossegurança, mais conhecido como Biosafety Clearing House (BCH), criado pelo Artigo 20 do Protocolo e onde estão disponíveis dados sobre as avaliações de risco feitas por outros países parte do Protocolo e sobre os OGM aprovados para liberação comercial.


Devido ao fato do risco ser formalmente definido como uma função da exposição e de suas consequências, entendidas como os danos que podem ser causados à entidade que se quer proteger, torna-se imprescindível determinar o cenário que descreve a rota ao dano. Esta rota se refere à série de eventos que devem ocorrer de forma sucessiva para que o ponto final de avaliação seja afetado pela atividade, neste caso a liberação de um OGM no ambiente. Esses eventos podem ser criados por meio de hipóteses ou suposições de risco passíveis de serem investigadas. Estas suposições não são especulações, mas deduções plausíveis. O uso de hipóteses de risco que conduzem a avaliação de risco através de uma rota ao dano confere validade científica ao processo.

A abordagem através de eventos que, quando ocorrem, mantêm a cadeia que leva a um dano, facilita o processo de avaliação dos cenários imaginados, e permite eliminar muitas rotas ao dano que não são plausíveis. Isto é muito importante também na etapa de comunicação de risco, porque é possível explicar que durante o processo de avaliação foi considerado um possível perigo ou dano em particular, mas que ele foi descartado pela ausência de uma rota plausível para a sua ocorrência.

A Figura 3 apresenta um cenário hipotético de dano resultante do cultivo de uma planta transgênica, tendo como ponto final de avaliação uma população selvagem de uma planta de interesse, por exemplo, uma espécie em extinção que compartilha seu habitat com um parente selvagem do OGM que se planeja cultivar. O exemplo de rota ao dano foi desenhado a partir da seguinte hipótese geral de risco: “A cultura GM, através de fluxo de pólen, vai conferir uma nova característica ao seu parente selvagem que será mais invasivo e deslocará a planta de interesse X de seu habitat”, que representa o ponto final de avaliação da meta de proteção.


Figura 3. A rota ao dano devido ao fluxo de genes e à vantagem competitiva conferida pela modificação genética. Este diagrama mostra todos os eventos que devem ocorrer antes que o fluxo de genes possa causar danos, destacando os critérios que devem ser estabelecidos para avaliar o potencial impacto, neste caso, sobre uma população de interesse.


1.4 Quarto passo: Classificação do risco

A quarta etapa da avaliação de risco é a classificação do risco, feita com base na probabilidade de materialização de um perigo e, em havendo, nos danos/ consequências sobre os parâmetros avaliados associados à manifestação do perigo às metas de proteção.
A categorização do nível de risco é sempre um exercício difícil; sugere-se, portanto, o uso de uma matriz tabular, criada para ajudar os avaliadores de riscos. Para poder empregar a matriz o avaliador deve estimar a magnitude dos danos em uma de quatro possíveis classes, assim como a probabilidade de que o dano se concretize. Guias para estas classificações encontram-se nos quadros a seguir.
Quadro 1: Os quatro níveis (ou classes) de possibilidade de ocorrência de dano devido à introdução de um OGM

Probabilidade de dano devido à adoção de um OGM
Muito baixa
O dano pode ocorrer apenas em raras circunstâncias
Baixa
O dano pode ocorrer em algumas circunstâncias limitadas
Alta
O dano pode ocorrer em muitas circunstâncias
Muito alta
O dano pode ocorrer na maioria das circunstâncias

Quadro 2: Os quatro níveis(ou classes) de dano devido à introdução de um OGM

Dano à saúde ou ao ambiente devido à adoção de um OGM
Marginal
Aumento mínimo ou inexistente de doenças e outras agressões à saúde humana ou animal
Aumento mínimo ou inexistente de danos a metas de proteção do ambiente
Menor
Aumento mínimo doenças e outras agressões à saúde humana ou animal, que pode ser rapidamente revertido
Aumento mínimo de danos a metas de proteção do ambiente, limitado temporal e espacialmente ou restrito a um número reduzido de indivíduos
Intermediário
Aumento significativo doenças e outras agressões à saúde humana ou animal, que requer tratamento especializado
Aumento mínimo de danos a metas de proteção do ambiente, amplamente distribuído, mas reversíveis a curto prazo e de severidade limitada
Grande
Aumento significativo doenças e outras agressões à saúde humana ou animal, com tratamento difícil ou inexistente
Aumento significativo de danos a metas de proteção do ambiente, amplamente distribuído, afetando populações inteiras, disruptivo para ecossistemas, comunidades de organismos ou toda uma espécie, e de difícil reversão

Deve-se enfatizar que a classificação do dano baseia-se na extensão dos danos e na sua reversibilidade. Especificamente no caso dos danos ao ambiente, são as populações de organismos que interessam, e não apenas os indivíduos que visitam o local onde está o OGM. Assim, por exemplo, o impacto de uma planta com propriedades inseticidas será sempre menor desde que não afete populações de insetos não alvo, mas esteja limitada aos indivíduos que frequentam a plantação.


Tabela 4: Algoritmo tabular para estimação qualitativa do risco da introdução de um OGM no meio ambiente. As estimativas de dano (devido à exposição) e de probabilidade (ou frequência / amplitude de exposição) devem ser feitas com base na informação obtida no passo de caracterização de risco (adaptado de Sousa e Andrade, 2012 e OGTR, 2013, disponível em http://www.ogtr.gov.au/internet/ogtr/publishing.nsf/Content/raffinal5-toc - versão html e http://www.ogtr.gov.au/internet/ogtr/publishing.nsf/Content/42D3AAD51452D5ECCA2574550015E69F/$File/raffinal5_2.pdf).

Os riscos avaliados para os OGM liberados comercialmente foram considerados insignificantes (ou desprezíveis), no sentido de não terem um impacto ambiental negativo diferente daqueles advindos das variedades não GM dos mesmos organismos. Portanto, como mostrado na Figura 4, ou as consequências foram avaliadas como marginais ou menores, ou a probabilidade de ocorrência de danos foi considerado baixa ou muito baixa.



1.5 Quinto passo: tomada de decisão
Uma vez determinados os riscos potenciais associados com a liberação de um OGM no meio ambiente, o avaliador decide se a liberação apresenta um risco aceitável ou que possa ser mitigado e define ações a serem tomadas (ou condições) para a gestão dos riscos.
O tipo de liberação desejada (confinada ou comercial) pode influenciar a decisão final. Como indicado anteriormente, o processo de avaliação de riscos de uma liberação comercial de OGM exige a aprovação de ensaios confinados (liberações planejadas) para obtenção dos dados necessários para a conclusão da avaliação. Assim, é essencial a aprovação de ensaios confinados e a avaliação de seus resultados para viabilizar a liberação comercial posterior. A adoção de moratórias e outras medidas restritivas à pesquisa e avaliação em campo de OGMs efetivamente priva o país da futura adoção desta tecnologia, por mais segura que ela tenha se provado em outros países.

O processo de decisão pode ser levado a cabo de diferentes maneiras, de acordo com a legislação de cada país. Em alguns casos, os avaliadores de risco decidem sobre a aceitabilidade dos riscos avaliados, definem medidas de gestão de risco e até mesmo tomam a decisão sobre a aprovação ou não de uma liberação comercial. Em outros países, a avaliação científica dos riscos determina uma recomendação para o órgão responsável pela gestão de risco e para aqueles que vão tomar a decisão final, que podem considerar outras questões, tais como aspectos socioeconômicos ou benefícios para embasar a decisão final. Quando esta última estratégia é adotada, as conclusões da avaliação de risco não devem ser passíveis de questionamento pelas demais instâncias, pois isto leva à imobilização dos tomadores de decisão.
No Brasil a avaliação de risco está ao encargo exclusivo da CTNBio. As considerações socioeconômicas devem ser levadas a cabo pelo Conselho Nacional de Biossegurança. Por isso mesmo, o parecer final da CTNBio sobre a segurança de um produto para comercialização tem seu efeito suspenso por 30 dias, no aguardo do pronunciamento do CNBS. Para maiores detalhes sugerimos a leitura de http://genpeace.blogspot.com.br/2013/09/ctnbio-rigor-and-transparency-on-gmo.html e http://genpeace.blogspot.com.br/2012/03/o-que-cabe-ctnbio.html.
Qualquer que seja o sistema adotado é muito importante que, na fase da comunicação de risco, o público seja informado de uma forma transparente sobre os elementos que pavimentaram a decisão.

Em suma, a avaliação de risco é o processo pelo qual se trata dos riscos que um OGM eventualmente traz ao meio ambiente e à saúde, com a meta de alcançar resultados confiáveis. Este processo, embora complexo e multifacetado, pode ser realizado através de um conjunto de metas e medidas de proteção que pode ser abordado de maneira prática e eficaz, garantindo uma proteção razoável do meio ambiente e mitigando, reduzindo ou evitando os riscos porventura identificados. Desta forma, evitam-se também atrasos desnecessários ao acesso do usuário aos avanços e desenvolvimentos tecnológicos. O Brasil beneficiou-se desta abordagem, aumentou significativamente sua exportação de grãos e agora é o segundo maior produtor de commodities geneticamente modificadas (soja, milho e algodão), com uma área total plantada em 2013 estimada em 40 milhões de hectares. A adoção da tecnologia no Brasil não se limitou a plantas GM, e mais de 50 eventos de produtos biotecnológicos foram aprovados pela CTNBio estando a maioria em comercialização em 2013.



Apêndice
Princípio da Precaução

Muitas vezes, a introdução de regulamentação de segurança para tecnologias emergentes foi reativa e não proativa, ou seja, apenas após um acidente e não antes. Essa experiência do passado motivou um tratamento diferente para a biotecnologia moderna. A influente conferência de Asilomar em 1975 (http://en.wikipedia.org/wiki/Asilomar_conference_on_recombinant_DNA) estava, proativamente, procurando segurança no uso da biotecnologia moderna, ou seja, estava aplicando o princípio de precaução ao avaliar e gerenciar riscos potenciais ou hipotéticos e colocar a ciência mais no domínio público.
Essa atitude proativa ainda é presente hoje, embora não tenha inspirado confiança a uma parte do : alguns grupos da sociedade levantaram dúvidas sobre a inocuidade alimentar e a segurança ambiental em seus ecossistemas e isso se refletiu em regulamentações e decisões políticas em vários países. A base da precaução é, efetivamente, a utilização da avaliação de risco como um elemento preditivo do comportamento futuro antecipado, o que permite a tomada segura de decisões. Frequentemente confunde-se isso com uma posição ou abordagem de precaução muito mais estrita, em conflito mesmo com o que reza o Princípio 15 do Protocolo de Cartagena (http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf), conhecido como Princípio da Precaução. Este princípio passou a ser ius scriptum no Brasil porque o País assinou a Convenção sobre a Diversidade Biológica, por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - ECO/92, a qual foi aprovada pelo Congresso Nacional e promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm). Também está inserido na Lei Nº 11.105/05 (Lei de Biossegurança - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm). Logo em seu artigo 1º o Princípio 15 diz textualmente:
“De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado  pelos Estados, de acordo com as suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.”

A interpretação do Princípio da Precaução deve ser feita com cautela e sensatez. A certeza científica não deve ser estrita, ou seja, não tem sentido exigir certeza cientifica de ausência de risco, uma vez que risco é parte da vida; não existe risco igual a zero. Até o Princípio de Precaução não é isento de riscos e uma de suas interpretações mais extremas é: “Em caso de dúvida, nada faça!”.  A história mostra que os riscos decorrentes da interpretação restritiva do Principio da Precaução causam danos irreparáveis e irreversíveis. As milhares de mortes pela varíola nos 60 anos de proibição da vacina e a guerra da vacina no Rio de Janeiro no século passado são apenas alguns exemplos.

A aplicação do Princípio da Precaução após a avaliação de risco só tem sentido se riscos de danos grandes forem identificados e não forem insignificantes. Muitas considerações sobre os riscos devem ser analisadas, como: sua classe (ou magnitude), o dano associado, que medidas podem ser usadas ou desenvolvidas para evitá-lo ou controlá-lo, dentre outras. A avaliação será sempre caso a caso. Uma interpretação equivocada de alguns quando evocam o Princípio da Precaução para todo e qualquer OGM é assumir o pressuposto de que qualquer atividade com OGM é causadora de degradação ambiental e representa perigo de dano grave e irreversível.
É extremamente importante observar que, mesmo antes da assinatura da Convenção de Biodiversidade, o Princípio da Precaução já havia sido adotado em nossa Constituição Federal de 1988, no caput do artigo 225, na medida em que determinou que lei regulasse as normas dos incisos II e V do § 1º, adotando-se medidas para defender o meio ambiente ou prevenir a sua destruição. Desse modo, para dar plena eficácia ao Princípio da Precaução, foi editada a primeira Lei de Biossegurança (Lei nº 8.974/95) e a atual (Lei nº 11.105/05), que regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal. O dispositivo estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados; cria a CTNBio e estabelece suas competências. O Princípio da Precaução é, portanto, preceito-base da Lei nº 11.105/05 (Lei de Biossegurança). No Brasil, compete à CTNBio, em conformidade com o disposto na Lei nº 11.105/05, efetuar essa análise de risco e identificar as atividades com OGM (Organismo Geneticamente Modificado) que ofereçam ou não ameaça de dano grave ou irreversível. Assim, como enfatizado anteriormente, a menos que a avaliação de risco, baseada em pressupostos científicos,  identifique ameaça séria e irreversível, e dificuldades de gerenciar o risco, não há razão para impedir avaliações de requerimentos na CTNBio tanto para condução de experimentos a campo (liberações planejadas) como para liberações comerciais.  O Princípio da Precaução não implica a proibição de utilizar tecnologia nova. Aliás, isso não seria precaução, mesmo porque a Constituinte de 1988 estabeleceu que a política agrícola levará em conta, principalmente, o incentivo à pesquisa e à tecnologia (art. 187, II, da CF/88).
Em conclusão, a interpretação adequada da precaução deve ser de tal forma a garantir a segurança ambiental e alimentária sem comprometer desnecessariamente os avanços tecnológicos. A CTNBio tem agido assim (veja-se a declaração da Presidência da CTNBio em 2013 - http://genpeace.blogspot.com.br/2013/09/ctnbio-rigor-and-transparency-on-gmo.html), apesar das críticas de alguns setores da sociedade





Referências originais do guia, adicionadas de outras específicas para o texto acima
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