Que o agenda setting
é determinado pelos grupos de poder, não há a menor dúvida. No caso dos
transgênicos (como em muitos outros,
aliás) ele está ao sabor das prioridades e oportunidades de visibilidade e
ganhos destes grupos. Mas raras vezes as posições dos vários grupos apareceram
tão claramente refletidas nas manchetes de suas notícias como no caso da suspensão
da venda do milho LL da Bayer nas regiões Norte e Nordeste. Fiz um trabalho de garimpo
das notícias que apareceram até 48 h depois da decisão do desembargador do
TRF4, em Porto Alegre, no dia 13 de março de 2014. Elas estão listadas abaixo,
grupadas por afiliação do grupo.
Uma leitura atenta mostra que o Governo Federal em seu
escalão mais alto (Portal Brasil) simpatiza com os que se opõem à biotecnologia
agrícola: a manchete leva de imediato o leitor a imaginar que os milhos
geneticamente modificados foram proibidos no Brasil. A leitura do conteúdo da
notícia prova que só a metade da história, ou menos, está contada (ver http://genpeace.blogspot.com.br/2014/03/justica-proibe-venda-de-milho.html).
O conteúdo da notícia é claramente uma cópia do que apareceu publicado nos
blogs e portais das ONGs que estão perfiladas contra os transgênicos no país,
ou suas simpatizantes. O alinhamento vai ao ponto de fazer constar na notícia
apenas as declarações da Terra de Direitos, sem qualquer entrevista com a
CTNBio, que é o órgão técnico do réu neste processo (a União). E não havia
desculpas: a CTNBio estava reunida bem pertinho, no CNPq, exatamente no dia 13
de março...
O segundo portal do Governo é o da Justiça Federal. É
evidente que eles foram imparciais e apenas notificam a decisão. Não cabe um
jornalismo investigativo neste portal, que pudesse informar ao leitor muitas
coisas que não estão na postagem citada acima e ainda o fato de que este milho
nunca foi efetivamente comercializado por aqui (Gazeta do Povo, http://agro.gazetadopovo.com.br/noticias/agricultura/milho/veto-a-milho-transgenico-nao-afeta-mercado/
). A decisão de suspender a venda desta
variedade “de gaveta” não é nova e já tinha sido comentada pela Abramilho
muitos anos atrás (http://www.abramilho.org.br/noticias.php?cod=1039).
No fundo, a suspensão tem um mínimo
impacto, tanto para criar jurisprudências como para afetar o mercado.
Os cinco primeiros portais de ONGs, todas alinhadas contra
os transgênicos, têm chamadas parecidas ou idênticas e o conteúdo é
essencialmente copiado do portal da Terra de Direitos. A notícia é apresentada,
desde a manchete até o final do conteúdo interno, como uma grande vitória da oposição
à biotecnologia agrícola, com frases e declarações que mais parecem palavras de
ordem do que uma notícia. Nas notícias destes blogs, que creem fazer um jornalismo
investigativo, não há sequer menção à derrota que o Idec, a AS-PTA, a Associação
Nacional de Pequenos Agricultores e a Terra de Direitos sofreram no Tribunal: o
ponto importante da ação era a suspensão das regras de coexistência e,
consequentemente, da venda de sementes e plantio de milho transgênico no país,
proibição esta que seria válida para todas as variedades!( http://aspta.org.br/campanha/663-2/;
ver comentários em http://genpeace.blogspot.com.br/2014/02/meandros-da-coexistencia-entre-milho.html).
Com o veredicto, por unanimidade, esta
pretensão está definitivamente soterrada.
O último portal de ONG é bastante mais neutro, estando a
posição claramente refletida na manchete. Mas o conteúdo não é próprio, e sim
copiado da Agência Brasil, uma mídia online. Aliás, as mídias online
investigadas nesta janela temporal de dois dias após a sentença, sejam grandes
ou pequenas, foram relativamente neutras, mas não chegaram ao cerne da ação nem
investigaram a totalidade da decisão. Em outras palavras: falharam redondamente
em trazer ao leitor uma informação completa.
Ao fim da tabela há o link para uma postagem de nosso blog,
onde comentamos a decisão. Também não é completa porque não temos o processo
nem a decisão em mãos e porque não somos juristas, mas fizemos o que estava ao
nosso alcance para mostrar o lado B da notícia que constava no portal da Terra
de Direitos.
Tabela 1: Clipping de notícias disponíveis na internet
até 48 depois da sentença do desembargador do TRF4, que suspendeu a
comercialização do milho LL da Bayer no Norte e no Nordeste do Brasil. As
notícias estão divididas por grupos de maiorias (ou grupos de poder). Como outgroup foi incluída a análise da
notícia no blog GenPeace, que reflete a opinião de um grupo majoritário na
CTNBio, mas que é essencialmente escrita pelo proprietário do blog.
Afiliação
|
Nome
|
Título da reportagem
|
Link
|
Governo
|
Portal
Brasil
|
Tribunal impede liberação de milho
transgênico
|
|
Governo
|
Justiça
Federal
|
TRF4 proíbe comercialização de milho
transgênico no Norte e Nordeste do Brasil
|
|
ONG
|
Terra de
Direitos
|
Com voto histórico, TRF4 impede a
liberação de milho transgênico da Bayer
|
|
ONG
|
MST
|
Com voto histórico, TRF4 impede a
liberação de milho transgênico da Bayer
|
|
ONG
|
IDEC
|
Milho transgênico da Bayer não pode
mais ser comercializado
|
|
ONG
|
Adital
|
Vitória contra a comercialização de
milho transgênico
|
|
ONG
|
Pulsar -
AMARC
|
Milho transgênico da Bayer tem sua liberação anulada
|
|
ONG
|
EcosBrasil
|
Justiça proíbe venda de milho
transgênico no Norte e Nordeste
|
|
Grande
mídia
|
Sergipe
Agora
|
Justiça proíbe venda de milho
transgênico da Bayer no Norte e Nordeste
|
|
Grande
mídia
|
Gazeta do
Povo (Londrina)
|
Veto a milho transgênico não afeta
mercado
|
|
Mídia
online
|
Agência
Brasil EBC
|
Justiça proíbe venda de milho
transgênico da Bayer no Norte e Nordeste
|
|
Mídia
online
|
Regional Águas da Serra
|
Justiça mantém comercialização de milho
transgênico no Sul do país
|
|
Pessoa
física
|
Genpeace
|
Justiça proíbe venda de milho
transgênico da Bayer no Norte e Nordeste do Brasil: e o que mais? Escondendo
informação do público
|
***********************************************
Nenhum comentário:
Postar um comentário