Em requerimento datado de 01 de outubro de 2012 e encaminhado
à Ministra-Chefe da Casa Civil e Presidente do Conselho Nacional de
Biossegurança, ao Ministro – Chefe da Secretaria Geral da Presidência da
República, ao Sub-Procurador Geral da República e Coordenador da 4ª Câmara de
Coordenação e Revisão do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural Brasileiro, ao Diretor-Presidente
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, ao Presidente do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, à Presidente
do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e ao Presidente da
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, várias organizações da sociedade civil
e movimentos sociais pedem que seja refeita a avaliação de risco do milho
modificado geneticamente NK603
e concedida a suspensão da
liberação comercial deste evento, e demais piramidados que possuam esta
tecnologia em sua
formulação, até que
resultados de pesquisas
independentes confirmem sua segurança alimentar e nutricional.
O requerimento está respaldado pelo Artigo 14 da lei 11.105
(lei de Biossegurança), que diz caber à CTNBio:
XXI – reavaliar suas decisões técnicas por solicitação de seus membros ou por recurso dos órgãos e entidades de registro e fiscalização, fundamentado em fatos ou conhecimentos científicos
novos, que sejam
relevantes quanto à
biossegurança do OGM ou derivado, na forma desta Lei e
seu regulamento;
Desta forma, caberia aos órgãos
de registro e fiscalização do MAPA, do MMA, do Ministério da Saúde e do Ministério
da Pesca encaminhar este requerimento à CTNBio ou, alternativamente, a um ou mais
de seus membros. Na CTNBio discutiu-se, na reunião de outubro de 2012 (a
primeira depois da publicação online do trabalho de Séralini e cols.), a
qualidade do artigo do grupo francês, havendo um parecer de membros e
consultores ad hoc contrário às
conclusões do artigo, que deve ser encaminhado às autoridades pertinentes. Não
foi aventada a possibilidade de se proceder a uma nova avaliação de risco do
evento NK603 nem dos eventos piramidados que o contenham.
Compreende-se, portanto, que
algumas organizações sociais tenham vindo a público solicitar que os órgãos de
registro e fiscalização peçam à CTNBio a reavaliação do risco do evento para a
saúde humana e animal e para o meio ambiente. Isso foi feito. Entretanto, as
organizações também solicitaram a imediata suspensão da comercialização do
evento e seus piramidados, sem deixar claro a quem se dirige esta solicitação.
Ora, ela deveria ter sido dirigida também à CTNBio, como claramente indica a
lei. Assim como foi feito, o pedido vaza para as demais instâncias e compromete
a legalidade da tomada de decisões.
Também se compreende a urgência
no requerimento, uma vez que danos graves à saúde haviam sido descritos pelo
grupo francês, advindos do consumo deste milho transgênico por ratos. Assumindo
que um artigo científico publicado em revista de circulação internacional, de
corpo editorial rígido e revisão por pares deve ser verdadeiro, sem dúvida justifica-se,
mas apenas em princípio, o requerimento e sua urgência. E porque esta ressalva?
Porque o aceite de um trabalho por uma revista séria não é um carimbo de sua
qualidade. E porque a experiência só se transforma em fato se confirmada e se
incorporada à linha mestra de pensamento cientifico. No caso do artigo em
pauta, isso jamais acontecerá, como explicado mais abaixo. Com isso, o
requerimento perde a razão de ser e deve ser arquivado pelos destinatários.
Cumpre ressaltar que há várias
imprecisões e afirmações não apoiadas em fatos no requerimento das entidades. Uma
das mais sérias é a afirmação de que “como todas as liberações comerciais de organismos geneticamente
modificados no Brasil, os estudos que embasaram a autorização do plantio,
comercialização e consumo deste transgênico se basearam em pesquisas efetuadas
a curto prazo, e estudos não publicados elaborados pela própria empresa
proponente”. A afirmação é duplamente falsa e tem como objetivo lançar dúvidas
quanto à qualidade da avaliação de risco específica feita para o evento NK603
em pauta.
Primeiramente, é preciso saber que, de fato, a empresa
proponente envia todos os estudos de biossegurança exigidos pela CTNBio e ainda
outros, feitos no Brasil e em outros países, que possam aportar dados à
avaliação de risco. Mas tmbém é preciso estar bem consciente de que a CTNBio se
serve sobretudo da farta informação
publicada em periódicos internacionais e nos pareceres de outras agências
governamentais de avaliação de risco. Quanto aos pareceres favoráveis à
liberação deste evento, apoiados por cuidadosas avaliações de risco conduzidas
em muitos países, a tabela abaixo resumo o quadro atual. Dos 15 países que
aprovaram o evento, 13 o fizeram antes do
Brasil. Portanto, ao emitir seu próprio parecer, a CTNBio estava respaldada na
análise de mais de uma dezena de agências especializadas em risco de OGM, e não
apenas na informação da proponente, como erroneamente afirmado no requerimento
das entidades da sociedade civil. Esta afirmação inteiramente falsa é
sistematicamente divulgada por canais diversos na internet.
Tabela I: Países onde o evento NK603 foi aprovado, datas de
aprovação e uso proposto.
País
|
Plantio
|
Alimento ou ração
|
Alimento
|
Ração
|
|
África do Sul
|
2002
|
2002
|
|
||
2004
|
2004
|
|
|||
2002
|
|
||||
2008
|
2008
|
|
|||
2001
|
2001
|
2001
|
|
||
2005
|
|
||||
2004
|
|
||||
2002
|
2004
|
|
|||
2009
|
|
||||
2000
|
2000
|
|
|||
2005
|
2003
|
|
|||
2001
|
2001
|
2001
|
|
||
2002
|
|
||||
2003
|
|
||||
União Europeia
|
2004
|
2004
|
|
||
2011
|
2011
|
Em segundo lugar, cumpre esclarecer que o conhecimento
acumulado no nível mundial sobre a segurança alimentar da proteína EPSPS (expressa
no evento NK603) é enorme, proveniente de trabalhos
independentes conduzidos por pesquisadores em inúmeros países. Da mesma
forma, foram feitos experimentos de curto e longo prazo com animais (para os de
longo prazo veja-se Snell et al., 2012 -http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0278691511006399),
mostrando que não houve qualquer efeito deletério na saúde de ratos, camundongos,
coelhos, vacas, etc. Boa parte destes estudos já estava disponível ao tempo da
decisão da CTNBio para a liberação comercial do evento NK603, em 2008.
Assim, o parecer da CTNBio apoiou-se na melhor ciência e nos pareceres anteriores de outras
agências de avaliação de risco de OGM, além dos resultados experimentais
encaminhados pela proponente (com farta documentação comprobatória e, em muito
casos, com inspeção in loco pelo MAPA
e até mesmo pela CTNBio).
No item 2 do requerimento as entidades trazem, como única
evidência de dano causada pelo milho NK603, o artigo científico de Séralini e
cols., publicado em meados de setembro e imensamente alardeado pela mídia desde
o dia de seu lançamento (por iniciativa do seu autor principal). É
compreensível que as entidades civis signatárias do requerimento tenham se
preocupado com os resultados deste experimento, uma vez que foi publicado numa
revista de corpo editorial rígido. Também é compreensível que não tenham
chegado à conclusão de que o trabalho publicado não se sustentava e que era de
péssima qualidade porque:
a)
A polêmica na mídia trazia opiniões favoráveis
ao artigo, assim com críticas desfavoráveis;
b)
As entidades signatárias não são especialistas
em avaliação de risco nem em toxicologia.
Desta forma, e considerando que o requerimento foi
encaminhado aos destinatários no início de outubro, quando as manifestações de
órgãos e agências oficiais de risco, academias e outras instâncias cientificas
ainda eram escassas, está inteiramente justificado o procedimento, sobretudo
respaldado na abordagem da precaução.
Entretanto, nas últimas duas semanas ficou claro que o
trabalho citado no documento das entidades como única peça de evidência para
indicar insegurança alimentar do evento e apoiar todos os requerimentos é,
de fato, um exemplo completo de trabalho mal conduzido, que não permite
concluir sobre a segurança alimentar do milho transgênico em pauta. No nível
europeu quase uma dezena de instituições nacionais ou regionais (agências de
avaliação de risco e a própria EFSA) desacreditaram inteiramente o artigo.
Finalmente, também a França de posicionou, tanto através de seis academias de
ciência como, logo depois, através do ANSES e do Alto Conselho de
Biotecnologias (equivalentes aproximadamente à CTNBio e ao CNBS). O proprio
Governo da França comunicou, encerrando a polêmica, que não irá suspender a
autorização para uso comercial do produto (importação e consumo). Cientistas
brasileiros já tinham também trazido luz a esta questão.
Não cabe aqui uma discussão detalhada das falhas experimentais
gravíssimas, tanto no desenho como na condução, embutidas neste trabalho de
Séralini. Consideramos que ele não se sustenta nem traz qualquer informação,
por mínima que seja, que permita colocar em discussão a segurança deste evento.
Levando isso em conta, o requerimento perde a razão de ser.
Por fim, cabe ressaltar que a CTNBio acompanha de perto os
relatos sobre eventuais danos à saúde humana ou animal ou ao meio ambiente
atribuídos aos OGMs e avalia sua qualidade, de forma independente e científica.
Também avalia as demonstrações novas, diretas ou indiretas, da segurança dos
produtos GM liberados no Brasil.
Como demonstração clara da segurança deste evento, sugerimos
a leitura do texto que mostra o consumo seguro de alimentos formulados com este
evento pelo Mundo afora, sem relatos de tumores ou outro problema de saúde
qualquer, em homens ou nos animais de criação e companhia (http://genpeace.blogspot.com.br/2012/10/the-largest-experiment-with-human.html).
Nenhum comentário:
Postar um comentário