segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Desabonar as opiniões das academias e agências de avaliação de risco é estratégia adotada na luta contra os transgênicos


Para algumas organizações sociais que julgam falar por todos os agricultores deste país caiu como uma luva a declaração do estatístico francês Paul Deheuvels. Este professor declara recusar de antemão qualquer texto que seja apresentado em nome de várias academias partindo do fato de que o comitê que o assina não representaria mais do que a si mesmo, independentemente da eminência de seus membros. Segundo Deheuvels, “Um grupo de experts foi reunido às pressas, não sabemos por quem, ninguém sabe como, e com total falta de transparência na seleção de seus membros. Essas pessoas estavam dispostas a escrever em pouquíssimo tempo uma nota bastante crítica ao estudo. Eles não podem alegar que sua opinião é endossada por todo meio acadêmico da França”.

Com este perigoso argumento, vários questionamentos podem ser feitos a qualquer entidade que tire uma posição técnica por consulta a seus especialistas. Vamos analisar a situação com alguns exemplos:

1.       A linha de argumentação principal que a oposição aos transgênicos está empregando contra as seis Academias é: a posição não foi tirada por consenso, não houve uma discussão, os "especialistas" não foram consultados, etc. A argumentação pode se estender a toda uma dezena de outros órgãos especializados de vários países (inclusive a CTNBio), que também reprovaram o artigo e, em alguns casos, reprovaram também a conduta dos seus autores e da revista que displicentemente aceitou a coisa...

Nossas considerações: Não é costume (ainda que até se possa) pedir que TODOS os membros de uma academia assinem, se quiserem, um documento que se posicione contrário a uma pesquisa. Quem argumenta com essa parlapatice de exigir número elevado de assinaturas está equivocado ou usa de má fé. Observem bem os leitores: nem mesmo nas associações que apoiam os que combatem os transgênicos, os documentos de apoio ou de crítica são assinados por um grande número de técnicos. Em geral é igualmente um número pequeno de pessoas que assina os documentos. Então vale perguntar (e deve-se perguntar): quantas mil assinaturas essa gente recolheu para poder escrever um texto público metendo o pau nas academias francesas, na CTNBio e em quem mais for? TODA associação, academia ou órgão representativo tem porta-vozes, diretoria, subcomissões e mais um monte de gente que, num primeiro embate, assina por todos os membros. O trabalho do Séralini é tão torpe que não vale uma plenária, nem por Internet. O funcionamento normal dessas academias é o suficiente para rejeitá-lo.

Nota: No caso das Academias francesas, foram consultados especialistas, só que aparentemente não os que os eco-xiítas gostariam que tivessem sido...


2.       Aqui no Brasil a oposição aos transgênicos vai provavelmente argumentar: a posição da Presidência da CTNBio foi feita com base num parecer encomendado a quatro especialistas. Deveriam ter consultado a Plenária, dada a “seriedade” do assunto (assumindo que o artigo em pauta seja sério).

Nossas considerações: Muito mais do que uma prerrogativa do presidente (que soa autoritário para esses candidatos a autoridade, eles mesmos), é desse modo que a coisa funciona no Mundo todo, inclusive entre os eco-deslumbrados e "écolos bobos".  Esse ideia de desautorizar pareceres é anti-científica. Claro que a posição dos especialistas em nada difere da posição dos referees na publicação de um trabalho. Pode ser contestada ou desafiada com base tanto em posições individuais quanto em posições de academias, pois nada em ciência pode ser considerado definitivo. Mas a ciência não trabalha com base em plenárias, trabalha em pequenos grupos. Justamente por isso é que se manifesta como se está manifestando. Quem critica a forma com que as academias condenaram o trabalho do Séralini precisa ser "chamado às falas" para cair na real. Afinal, cada academia tem muitos membros e até agora os eco-xiítas não apareceram com abaixo-assinados de membros dessas academias reclamando do posicionamento de suas comissões ad-hoc no julgamento do trabalho do Séralini. Não é correto sair contestando toda a forma de manifestação das organizações científicas porque isso lhes tira credibilidade e é justamente a credibilidade (strictu sensu - capacidade de ser-se acreditado) que dá autoridade à ciência. É uma ação de terror que a oposição faz, sobretudo porque não propõe nada para por em seu lugar. Plenárias para extrair uma declaração contra o trabalho pífio do Séralini....aqui, como na França, seria simplesmente ridículo. A ciência tem mais o que fazer.

3.       Mesmo que o parecer dos quatro especialistas seja votado na Plenária da CTNBio no dia 8 próximo, seguramente não vai haver consenso e a oposição aos transgênicos vai dizer, como sempre diz, que foi o grupo alinhado às empresas do agronegócio que decidiu .

Nossas considerações: Pois é, vai dizer mesmo. Mas é preciso lembrar a eles e a todos que apenas dois ou três referees - anônimos - deixaram passar o infame texto do Séralini. Quer uma minoria menor e mais anônima do que isso? Os cientistas não reclamam disso - com razão. E a oposição argumenta que a aceitação do artigo pela revista lhe dá total credibilidade! Mas que exemplo gritante de dois pesos e duas medidas!

E porque os cientistas não reclamaram? Justamente porque  é assim que ciência funciona, não apenas agora mas SEMPRE! O trabalho vem a público - de preferência sem a palhaçada midiática do bufão -  e é imediatamente julgado pela comunidade científica. Se não prestar, como é o caso, começam a pipocar críticas no seio da própria ciência, em geral por iniciativa dos próprios colegas pesquisadores. Normalmente as academias não entram na história porque os trabalhos científicos não costumam ser anunciados com mega-eventos de mídia. Mas quando o estardalhaço é grande e a qualidade pouca, as academias manifestam-se, exatamente como fizeram agora. Eventualmente condenam o artigo; e a revista que o publicou muitas vezes também obriga o autor a fazer uma retratação. Já aconteceu no passado. É importantíssimo chamar a atenção da turma do auê pseudo-ecológico para o fato óbvio de que a condenação a um artigo não impede seus autores de corrigir os procedimentos considerados falhos e tentar republicá-lo. Em geral isso acontece ainda ao nível da avaliação dos referees, mas quando acontece do artigo vir à luz e ser duramente criticado, é em geral somente após ser refeito - por vezes pelo mesmo grupo - que ele acaba sendo aceito. E, quando isso acontece, as críticas desaparecem.

Os defensores do Séralini aparentemente não sabem de nada disso; A oposição aos cientistas acha que tem outro sistema melhor? Que o explique e o defenda!.

Consideração pra meditar: não houve um único cientista sério, nem unzinho, que saísse em defesa do artigo do Séralini, com texto de punho próprio; só as figurinhas carimbadas de sempre e os institutos pagos pela oposição internacional aos transgênicos e pelas empresas de alimentos interessadas no nicho “GMO free”. Cabe a pergunta final? Porque só aparece a defender o Séralini quem notoriamente milita na oposição aos transgênicos? Fica difícil entender, por exemplo, porque não se manifestam maciçamente a favor do Séralini seus colegas da Universidade de Caen (primeira linha da defensoria "esprit de corps", pelo menos em tese) ou os montes de biólogos trabalhando em áreas correlatas à dele, sobretudo os toxicologistas. Bem ao contrário, foi justamente um professor aposentado de Caen o que lhe fez talvez a mais dura crítica até agora....(http://genpeace.blogspot.com.br/2012/10/seralini-o-bufao-dos-transgenicos-como.html)

Encerrando: a decisão baseada em ciência no seio da CTNBio provavelmente será a de rejeitar a validade do artigo do Séralini e, portanto, invalidar o pleito de reconsideração da avaliação de risco do milho NK603, como já havíamos mencionado. O que vai sair na mídia (internet e jornais sensacionalistas ou alinhados ao movimento contra os transgênicos)? Que o Governo Brasileiro está assinando a sentença de morte de gente e bicho, como ser facilmente aquilatado pelo enorme aumento na incidência de câncer na população humana e animal, sobretudo em porcos e galinhas, grandes comedores de milho, desde a liberação do milho NK603 em 2008...Afinal,se ratos adoecem em dois anos, os demais bichos não vão precisar de dez ou cem, basta comer este poderoso veneno por 4 anos(2008 - 2012)! Mas a CTNBio acompanhou o parecer de muitas outras agências de avaliação de risco no Mundo e até agora não há relatos desta esperada escalada no aparecimento de tumores (veja-se http://genpeace.blogspot.com.br/2012/10/the-largest-experiment-with-human.html)

No fundo, a turma que considera todos os cientistas como torpes vendilhões do templo, de si mesma tem imagem muito melhor, talvez como a Natureza (humana) na Imitação de Cristo: gloriatur de nobili loco et ortu generis, arridet potentibus, blanditur divitibus, applaudit sibi similibus *; sobretudo a última afirmação!


(*) She glories in the nobility of her stock and descent; she fawns on those in power,flatters the rich, and applauds those who are like herself.

Um comentário:

  1. FRANÇA – 140 CIENTISTAS DESABONAM ACADEMIAS E AGÊNCIAS
    Favor ler a Declaração conjunta “Ciência e Consciência” assinada por 140 cientistas da França, publicada no jornal Le Monde, desabonando exatamente as opiniões das Academias e das Agências. E não venham dizer que estes 140 cientistas (do CNRS, das Universidades francesas, etc.) são todos “ecolôs” fanáticos e ignorantes. O link para a publicação é: http://www.lemonde.fr/idees/article/2012/11/14/science-et-conscience_1790174_3232.html
    Como já disse o bom Jesus Cristo: “A verdade vos libertará”. Ah, humanidade! até quando?...

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