Em carta ao presidente da EMBRAPA, Dr. Maurício Lopes, o Dr.
Luiz Antônio Barreto de Castro comenta detalhadamente a importância do feijão
EMBRAPA 5.1 e a inadequação dos argumentos trazidos à luz na Nota Técnica
relativa à existência de um carlavírus na cultura do feijoeiro. Suas
considerações complementam as do Dr. Walter Colli (http://genpeace.blogspot.com.br/2014/12/embrapa-uma-decisao-que-se-impoe.html).
A seguir, o texto completo da carta do Dr. Luiz Antônio à presidência da
EMBRAPA.
Assunto: A liberação do feijão transgênico resistente ao
mosaico dourado
Senhor Presidente
Desde
1980 tenho trabalhado em engenharia genética em Brasília, boa parte deste tempo
no CENARGEN/EMBRAPA, onde iniciei engenharia genética de plantas no Brasil. Não
tenho dúvida que no CENARGEN funciona a melhor equipe de expressão de genes em
plantas do País. Também não tenho duvida que o marco histórico do CENARGEN, o
produto mais importante da EMBRAPA desde 1980, foi a obtenção pelas equipes de
Francisco Aragão do CENARGEN e Josias Correa de Farias do EMBRAPA Arroz e
Feijão, do feijão resistente ao mosaico dourado obtido pela tecnologia de RNA
interferente, que foi responsável pelo Premio Nobel em Fisiologia e Medicina em
2006 a Andrew Z. Fire e Craig C.Mello. Apenas quatro anos depois, os
pesquisadores da EMBRAPA acima citados tiveram seu memorial para liberação do
feijão transgênico aprovado na 145ª Reunião Ordinária da CTNBio, ocorrida em 15
de setembro de 2011, através do Parecer Técnico número 3024, sendo o primeiro
caso de utilização desta tecnologia para obtenção de uma planta geneticamente
modificada no mundo.
Importante
destacar que, de acordo com a legislação em vigor no país, quanto aos aspectos
de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio vincula
os demais órgãos e entidades da administração, não cabendo à qualquer órgão contestar
tais decisões em razão de questões técnicas. O Parecer aprovado pela CTNBio autoriza,
mas não obriga a quem solicitou a liberação de um OGM a fazê-lo. Entretanto, se
uma decisão deste Colegiado é contrariada por razões “técnicas”, tal procedimento
deverá ser feito à CTNBio pela CIBio competente, explicitando-se as razões que
levaram a essa conclusão. A CTNBio, e somente a CTNBio, detém a competência
para alterar ou revogar suas decisões e pareceres.
Ocorre
que, tendo tido ciência do conteúdo de Nota Técnica da própria EMBRAPA, de
julho de 2014, mais de três anos depois da liberação do feijão transgênico pela
CTNBio, venho apresentar alguns questionamentos e registrar minha indignação em
face das alegações apostas na referida Nota e do posicionamento adotado pela
EMBRAPA que tem, injustificadamente, retardado a liberação comercial do feijão transgênico
resistente ao mosaico dourado, aprovado pela CTNBio em 2011.
De
acordo com referida Nota Técnica, publicada na página oficial da EMBRAPA, sem
número e apócrifa, consta a indicação de que a EMBRAPA decidiu, por ora e sem previsão de tempo, não liberar comercialmente
o feijão transgênico resistente ao mosaico dourado, que a mesma solicitou
autorização à CTNBio, através de memorial minucioso , contendo mais de
trezentas páginas, elaborado por 02 (duas) CIBios.
Cabe
destacar que, para que a EMBRAPA alcançasse tal êxito – a liberação do feijão transgênico
- foram gastos anos e anos de pesquisa, bem como valores expressivos de
dinheiro público, tendo sido objeto de exaustiva e criteriosa avaliação dos
membros da CTNBio, que conta com a participação de 36 PhDs e, não por acaso, é por esta razão, o único órgão competente para
decidir sobre a liberação comercial de OGM de acordo com a lei número 11.105 de
24 de março de 2005.
Como
Presidente da Sociedade Brasileira de Biotecnologia, e com a experiência de
quem trabalhou na CTNBIO por doze anos, registro minha surpresa diante de
comunicação apresentada pela Secretaria de Comunicação da EMBRAPA, ao arrepio
do que determina a legislação nacional em vigor, sendo que os motivos ali
apresentados não justificam postergar, indefinidamente, o cumprimento de
decisão fundamentada da CTNBio.
Inicialmente,
causa-me estranheza o fato de tão importante manifestação da EMBRAPA ter sido
apresentada através de documento apócrifo de sua Secretaria de Comunicação, que
não detém a competência legal para tanto, e não pelas CIBIos competentes da
EMBRAPA que apresentaram o memorial à submissão do colegiado.
Da
análise atenta da legislação em vigor no país sobre a matéria, pode-se verificar
que qualquer alteração de decisão da CTNBio deverá ser apresentada pelas CIBio
dos Centros da EMBRAPA. Entendo, ainda, que essas CIBios devem apresentar as
questões que impedem a EMBRAPA em cumprir uma decisão daquele colegiado,
podendo, inclusive, caso entendam necessário, até requerer a revogação do referido
Parecer Técnico número 3024.
Considerando
que a lei de biossegurança preserva expressamente o princípio da precaução, e
que cabe à administração pública rever seus atos, caso a EMBRAPA tenha dúvidas
sobre a liberação do feijão transgênico, esta poderá solicitar, através da
análise técnica de suas CIBios, apresentar seu pedido fundamentado à CTNBio,
mas nada justifica a EMBRAPA desconsiderar a aprovação concedida pela CTNBio.
Também
não se justifica a alegação de que “O
feijão transgênico cumpre até o momento sua finalidade, que é eliminar o risco
de infecção das lavouras pelo mosaico dourado, doença que causa prejuízo entre
40% e 70% das lavouras.”, ou mais, pois, sem a sua efetiva liberação
comercial, não há como afirmar que este feijão cumpre sua finalidade, pois, até
hoje, referido feijão transgênico da EMBRAPA sequer foi registrado no
Ministério de Agricultura.
Vejamos,
ainda, as questões ora apresentadas sob uma ótica agronômica: a ocorrência de
forma mais evidente do Carlavírus, que é transmitido também pela mosca branca e
causa uma perda muito menor da lavoura do feijão (cerca de 30%), comparada com
o mosaico dourado que causa uma perda de até 70%, a não ser que o feijão
transgênico seja utilizado. Na verdade, a perda é total se o plantio for feito
inadvertidamente na época de maior incidência de mosca branca.
Se a
razão desse novo posicionamento da EMBRAPA não fosse de biossegurança, mas sim
agronômica, não justificaria a EMBRAPA preferir que o produtor perdesse 70% de
sua colheita de feijão que 30%. O Carlavírus, ao contrário do que consta na
Nota Técnica, é conhecido há décadas e sua ocorrência não foi determinada pela
existência do feijão transgênico. Tese de doutorado sobre o Carlavírus foi
objeto da orientação do saudoso Álvaro Santos Costa, excelente virologista do
IAC na década de 80 (oitenta), a um dos seus estudantes .
Diante
desse cenário permita-me concluir que o atraso injustificável para a liberação
do feijão transgênico poderá ter como consequência o fato de que os produtores
de feijão continuarão a perder suas lavouras.
Em
resumo, o que propõe a Nota Técnica da EMBRAPA é que se aguarde obter um feijão
transgênico resistente aos dois vírus. Resta decidir o que se fazer até lá,
depois de mais anos e anos de pesquisa com dinheiro público: controle químico, MIP,
vazios de difícil operação, que se funcionassem com eficiência impediriam as
perdas das lavouras dos pequenos produtores de feijão, infelizmente não
organizados, antes da liberação desse novo tipo de feijão transgênico, medidas
agronômicas que repito não funcionam porque se funcionassem os produtores não
perderiam suas lavouras
Como
Presidente da Sociedade Brasileira de Biotecnologia tenho o dever legal, e até
mesmo moral, de insistir para que a EMBRAPA observe o fiel cumprimento da legislação
em vigor de Biossegurança, evitando postergar, injustificadamente e sem
fundamento técnico científico, a liberação comercial do feijão transgênico
resistente ao mosaico dourado, aprovado pelo Parecer Técnico 3024 da CTNBio,
ou, caso a EMBRAPA pretenda modificar seu pedido de liberação comercial caberá
a esta apresentar seu novo posicionamento através de fundamentação científica e
por meio de suas CIBIos do CENARGEN e da EMBRAPA Arroz e Feijão, que detêm competência
técnica e atribuição legal para analisar o que consta na referida Nota Técnica
da Secretaria de Comunicação da EMBRAPA, e se pronunciarem a respeito à CTNBIO.
Sendo
essas as considerações que julgo pertinentes tecer sobre a matéria.
Atenciosamente
Luiz
Antonio Barreto de Castro
Presidente
da Sociedade Brasileira de Biotecnologia
c/c
ao Presidente da \CTNBIO
Palmas para Embrapa que finalmente botou um freio nessa organização crimimosa chamada CTNBIO.
ResponderExcluirVc deve estar puto. Eu estou comemorando.