Muitas vezes a introdução de regulamentação de segurança
para tecnologias emergentes foi reativa e não proativa, ou seja, apenas após um
acidente e não antes. Essa experiência do passado motivou um tratamento
diferente para a biotecnologia moderna. A influente conferência de Asilomar em
1975 (http://en.wikipedia.org/wiki/Asilomar_conference_on_recombinant_DNA)
estava, proativamente, procurando segurança no uso da biotecnologia moderna, ou
seja, estava aplicando o princípio de precaução ao avaliar e gerenciar riscos
potenciais ou hipotéticos e colocar a ciência mais no domínio público.
Essa atitude proativa ainda é presente hoje, embora não
tenha inspirado confiança a todos os setores da sociedade: alguns grupos
levantaram dúvidas sobre a inocuidade alimentar e a segurança ambiental dos OGM
em seus ecossistemas e isso em alguns casos se refletiu em regulamentações e
decisões políticas em vários países. A base da precaução é,
efetivamente, a utilização da avaliação de risco como um elemento preditivo do
comportamento futuro antecipado, o que permite a tomada segura de decisões.
Frequentemente confunde-se isso com uma posição ou abordagem de precaução muito
mais estrita, em conflito mesmo com o que reza o Princípio 15 do Protocolo de
Cartagena
(http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf),
conhecido como Princípio da Precaução. Este princípio passou a ser ius
scriptum no Brasil porque o País assinou a Convenção sobre a Diversidade
Biológica, por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento - ECO/92, a qual foi aprovada pelo Congresso Nacional e
promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998. Também está inserido
na Lei Nº 11.105/05 (Lei de Biossegurança). Logo
em seu artigo 1º o Princípio 15 diz textualmente:
“De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da
precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com as suas
capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência
de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar
medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação
ambiental.”
A interpretação do Princípio da Precaução deve ser feita com
cautela e sensatez. A certeza científica não deve ser estrita, ou seja, não tem
sentido exigir certeza cientifica de ausência de risco, uma vez que risco é
parte da vida; não existe risco igual a zero. Até o Princípio de Precaução não
é isento de riscos e uma de suas interpretações mais extremas é: “Em caso de dúvida,
nada faça!”. A história mostra que a
interpretação restritiva do Principio da Precaução causa danos irreparáveis e
irreversíveis: as milhares de mortes pela varíola nos 60 anos de proibição da
vacina e a guerra da vacina no Rio de Janeiro no século passado são apenas
alguns exemplos. No caso dos transgênicos o exagero na interpretação deste
princípio também tem levado a sérios prejuízos e mesmo a riscos à saúde e ao
ambiente (http://genpeace.blogspot.com.br/2013/10/analise-do-principio-da-precaucao.html).
A retomada do uso do Princípio da Precaução após a avaliação
de risco só tem sentido se riscos de danos graves forem identificados. Muitas
considerações sobre os riscos devem ser analisadas, como: sua classe (ou
magnitude), o dano associado, que medidas podem ser usadas ou desenvolvidas
para evitá-lo ou controlá-lo, dentre outras. A avaliação será sempre caso a
caso. Uma interpretação equivocada de alguns, quando evocam o Princípio da
Precaução para todo e qualquer OGM, termina por assumir o pressuposto de que
qualquer atividade com OGM é causadora de degradação ambiental e representa
perigo de dano grave e irreversível, o que é errado.
É extremamente importante observar que, mesmo antes da
assinatura da Convenção de Biodiversidade, o Princípio da Precaução já havia
sido adotado em nossa Constituição Federal de 1988, no caput do artigo 225, na
medida em que determinou que a lei regulasse as normas dos incisos II e V do §
1º, adotando-se medidas para defender o meio ambiente ou prevenir a sua
destruição. Desse modo, para dar plena eficácia ao Princípio da Precaução, foi
editada a primeira Lei de Biossegurança (Lei nº 8.974/95) e a atual (Lei nº
11.105/05), que regulamenta os incisos da Constituição Federal citados acima. O
dispositivo estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e
liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados; cria a
CTNBio e estabelece suas competências. O Princípio da Precaução é, portanto,
preceito-base da Lei nº 11.105/05 (Lei de Biossegurança). No Brasil, compete à
CTNBio, em conformidade com o disposto na Lei nº 11.105/05, efetuar essa
análise de risco e identificar as atividades com OGM (Organismo Geneticamente
Modificado) que ofereçam ou não ameaça de dano grave ou irreversível. Assim,
como enfatizado anteriormente, a menos que a avaliação de risco, baseada em
pressupostos científicos, identifique
ameaça séria e irreversível, e dificuldades de gerenciar o risco, não há razão
para impedir avaliações de requerimentos na CTNBio tanto para condução de
experimentos a campo (liberações planejadas) como para liberações
comerciais. O Princípio da Precaução não
implica a proibição de utilizar tecnologia nova. Aliás, isso não seria
precaução, mesmo porque a Constituinte de 1988 estabeleceu que a política agrícola
levará em conta, principalmente, o incentivo à pesquisa e à tecnologia (art.
187, II, da CF/88).
Em conclusão, a interpretação adequada da precaução deve ser
de tal forma a garantir a segurança ambiental e alimentária sem comprometer
desnecessariamente os avanços tecnológicos. A CTNBio tem agido assim (veja-se a
declaração da Presidência da CTNBio em 2013),
apesar das críticas de alguns setores da sociedade
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