Recife, 08 de agosto de 2014
Esta semana que finda surgiu a surpreendente
notícia do uso de uma soroterapia contra o vírus Ebola a partir de anticorpos monoclonais humanizados
obtidos de... plantas de fumo transgênicas!
Sim, os dois pacientes que receberam os anticorpos estão
aparentemente se recuperando. Não, o produto não foi aprovado pelo FDA e nunca
tinha sido experimentado antes em seres humanos.
E agora, José? Frente ao imenso risco de morte representado
pela infecção do vírus Ebola, o uso de anticorpos purificados de planta (e não
de mielomas de camundongos) parece mesmo um risco ridiculamente pequeno.
Analisemos.
O que está sendo usado, a planta um produto dela?
Evidentemente, apenas um derivado dela. E não apenas um derivado bruto, mas
algo muito purificado, ainda mais puro do que álcool de usina ou óleo de
cozinha. No Brasil, um produto destes nem passaria pela CTNBio (por ser uma
substância pura – neste caso a mistura de dois anticorpos humanizados), mas
seria virado pelo avesso pela ANVISA, o que está correto. A planta de tabaco,
esta sim, teria que ter sido avaliada pela CTNBio. Mas lá nos EUA, como aqui ou
em qualquer outra parte do mundo, as plantas que produzem fármacos são ou serão
cultivadas sob rígido controle, ainda maior do que aquele das liberações
planejadas de plantas para uso alimentar. Então, os riscos aos alvos de
proteção (a biodiversidade) serão seguramente muito pequenos.
Voltemos ao risco dos anticorpos monoclonais: a planta
transgênica produz muito mais anticorpos do que o mieloma, não emprega qualquer
produto que possa comprometer a saúde humana e permite um grau de pureza muito
maior. Ora, se anticorpos de mieloma já são usados em terapêutica, qual seria o
problema dos anticorpos feitos por plantas transgênicas para nosso alvo de
proteção (a saúde humana)? A conclusão é: muito provavelmente, nenhum.
Bom, mas há os riscos não antecipados, que estão sempre na
ponta da língua de todos que se opõem a biotecnologia (inclusive dentro da
ANVISA). Seguramente, pode haver riscos que não conhecemos, derivados de
substâncias que copurificam com os anticorpos e que não foram detectadas pelos
métodos usuais de controle de qualidade de anticorpos monoclonais. A
probabilidade é baixíssima e o dano à pessoa poderia ser qualquer um, desde uma
simples alergia até a morte imediata. Mas nada disso foi visto em primatas, que
serviram de animais de experimentação! Então, pode-se considerar que os riscos
seriam negligenciáveis. Aqui termina a avaliação de risco.
E se os pacientes não recebessem o tratamento, qual seria o
risco? Com 90% de chance, uma morte muito rápida. Assim, frente aos enormes
prejuízos derivados da não adoção da tecnologia, e considerando que os riscos
de sua adoção foram considerados muito pequenos, é sábia a decisão do analista
de risco em ir em frente e tratar os dois pacientes.
Esta história serve para desmascarar a ideia insensata de
que a biotecnologia é coisa feita por vendidos às grandes empresas ou por
lugares tenentes de Satanás querendo destruir a Natureza. Não é nada disso: é
apenas mais uma tecnologia, como a comunicação por satélites, a aviação a jato,
os fornos de micro-ondas ou a televisão a LED.
Ontem a OMS autorizou os tratamentos experimentais de Ebola, numa conclusão óbvia de análise custo/benefício.
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