Texto do Prof. Paulo Andrade, Depto. Genética/ UFPE
Hoje, dia 10 de novembro de 2011, será relembrado como um marco na gestão de riscos de Organismos Geneticamente Modificados no Brasil: a CTNBio aprovou um novo sistema de monitoramento de OGMs que quebra paradigmas e inova em vários aspectos em relação aos sistemas vigentes no Mundo. O que há de novo na proposta? O fluxograma representado na figura 1 resume os passos que levam a um plano de monitoramento ou à sua isenção.
Figura 1: Fluxograma de ações e decisões na condução do plano de monitoramento pós liberação comercial, como constante da proposta aprovada em Plenária na CTNBio em 10 de novembro de 2011. O processo se inicia após a avaliação de risco e a decisão de liberação comercial, pois depende dos riscos apontados pela CTNBio nesta etapa. Se for solicitada e concedida a isenção, o processo se encerra. De outra forma, o plano de monitoramento se inicia em geral pelo monitoramento geral (vigilância geral ou general surveillance) e segue nele pelo tempo determinado pelo plano, exceto se danos forem associados ao OGM durante o período, quando então o monitoramento caso-específico é acionado. Outras opções de ação estão mostradas na figura. O fluxograma está disponível no formato pdf em http://www.mct.gov.br/upd_blob/0218/218394.pdf.
A inovação começa pela compreensão de que, em determinados casos, poderá haver isenção de monitoramento. Esta é uma questão polêmica e não será possível estabelecer um consenso em curto prazo, mas há desde já alguns casos de isenção em que há concordância de todos: os OGMs que não são liberados vivos no ambiente (cultivados em tanques de fermentação, etc.) ou aqueles que não proliferam no ambiente (como mosquitos transgênicos que morrem depois de alguns dias e cuja progênie também morre). Com o tempo, outros casos de isenção poderão vir a ser considerados pela CTNBio. É importante ter em mente que a lei brasileira não obriga o monitoramento de OGMs e que a decisão de exigir o monitoramento é muito mais uma questão de atendimento a uma demanda de determinados setores da sociedade do que uma necessidade explícita de gestão de riscos, uma vez que todos os OGMs até hoje liberados pela CTNBio foram considerados tão seguros quanto seus parentais não transgênicos. O monitoramento, desta forma, será em geral dirigido à detecção de danos associados a riscos não antecipados na avaliação de riscos que antecede a liberação comercial. Com o tempo e a experiência no Brasil e no Mundo com o cultivo e uso de vários OGMs, vai sendo construído um alicerce sólido de gestão de riscos que permitirá decidir se é produtivo monitorar um novo OGM ou se as informações precedentes permitem a isenção deste procedimento.
A inclusão da possibilidade de isenção é, assim, uma inovação positiva porque está alinhada com a melhor ciência, ajusta-se à avaliação de risco precedente e evita o dispêndio de tempo, recursos e pessoal em acompanhamento de produtos cuja biossegurança já esteja atestada por um histórico de uso seguro robusto ou por outros critérios, ou que não possa ser monitorado por questões técnicas. Adotar sempre um monitoramento denota excessiva precaução, que acaba criando barreiras importantes para o empreendedor nacional sem trazer qualquer segurança suplementar ao homem, aos animais de criação ou ao ambiente.
Outra inovação da proposta de monitoramento é a introdução do monitoramento geral
(general surveillance), que talvez pudesse ser melhor designado como vigilância geral. Este mecanismo consta da proposta européia, que tem quase uma década, embora ainda não efetivamente adotada, mas inova de forma importante na sua forma de atuação: enquanto a proposta européia se baseia no acompanhamento de variáveis numéricas extraídas de observações ambientais, com base em valores de base previamente estabelecidos, para múltiplos alvos de proteção, o sistema brasileiro usa alertas de danos diretos, sem auxílio de valores de base.
As duas formas de avaliar danos ambientais são muito diferentes, de fato. Na visão européia são desvios dos valores base que sugerem danos, mas a grandeza do desvio que pode disparar o sistema é uma disputa científica complexa, assim como a própria construção dos valores de base. Todo o sistema é extremamente dispendioso para o Estado que, na Europa, deve produzir os dados. Segundo o sistema de monitoramento brasileiro, os alertas de danos, gerados pelos participantes da rede de monitoramento geral, são avaliados pela empresa (que conduz o monitoramento e paga seu custo) e pela CTNBio, que deve ser comunicada a cada alerta de dano. Havendo uma base científica de causalidade entre o dano e o OGM, um experimento em contenção é conduzido para comprovar a hipótese (sempre previamente aprovado pela CTNBio e acompanhado por ela). Havendo corroboração do vínculo de causalidade, medidas mitigatórias devem ser adotadas e aí se inicial o processo de monitoramento caso específico. Este último pode ser disparado desde o inicio do monitoramento se riscos não-negligenciáveis foram identificados na avaliação de risco antes da liberação comercial. Esta abordagem é muito mais objetiva do que a européia e, adicionalmente, muito mais econômica, e está sumarizada na Figura 2 abaixo (parte do fluxograma da Figura 1)
Figura 2: Trecho retirado do fluxograma geral mostrando como um alerta gerado no monitoramento geral pode disparar o monitoramento caso específico. Um alerta exige a constatação da existência do efeito adverso (dano). Caso de fato exista, o alerta gera um relatório técnico à CTNBio que, juntamente com a empresa, avalia a relação causal entre o OGM e o dano. Havendo bases científicas para causalidade, experimentos específicos devem ser realizados, cujos resultados determinarão as ações seguintes.
Um ponto forte da forma brasileira de monitorar é a possibilidade de construção de uma rede de informação com participação efetiva de muitos atores das áreas onde será conduzido o monitoramento. Embora a proposta européia também descreva uma rede, ela é muito mais restrita porque é responsável pela criação do banco de dados de valores de base e exige alta qualificação de seus membros, algo complexo e fora da realidade dos órgãos de extensão rural, empresas ligadas ao comércio de produtos agrícolas, associações de produtores e outras formas de organização social no Brasil. A rede de informações pode ter grande capilaridade e deve estar aberta para a entrada de alertas de diferentes naturezas. A qualidade da rede é avaliada pela consistência dos alertas, podendo haver exclusão de componentes que gerem com freqüência alertas inconsistentes. Por outro lado, a rede não é aberta ao público. Assim, uma rede bem construída representa uma fonte valiosíssima de informações, sem gerar alertas inconsistentes freqüentes.
Em conclusão, o novo sistema de monitoramento incorpora decisões importantes para alinhar as demandas incluídas no plano de monitoramento à avaliação de risco e torná-lo efetivo e de custo compatível aos seus possíveis resultados. Ele é também flexível e poderá ser ajustado à realidade brasileira ao longo dos próximos anos em função do aumento da experiência brasileira na área. Assim, ele atende à demanda da sociedade brasileira por transparência, uso racional de recursos, oportunidade para as empresas nacionais e segurança alimentar e ambiental, sem empregar uma abordagem de precaução excessiva e sobrecarregar a sociedade com custos desnecessários, fatalmente repassados ao consumidor final.
ola Parabens pelo blog, sempre bom discutir estes assuntos. Tambem tenho um blog se quiser dar uma olhada http://falandodedna.wordpress.com/
ResponderExcluirabraco
Clarissa